quarta-feira, 24 de junho de 2015

Salto de qualidade na educação do Vietnã surpreende especialistas


  

O desempenho do Vietnã na última prova PISA – Programa para a Avaliação Internacional de Alunos – foi excelente. Na primeira participação do país asiático nas provas organizadas pela OCDE, os jovens vietnamitas de 15 anos tiveram pontuações mais altas em leitura, Matemática e Ciências do que muitos estudantes de países desenvolvidos, incluindo Estados Unidos e Reino Unido. 

Por Andreas Schleich* 



O feito surpreendeu as autoridades do Vietnã e os observadores externos. Existem três fatores importantes que contribuíram para estes resultados incríveis: um governo comprometido, um plano de estudos bem pensado e um forte investimento nos professores.

Investimentos

O governo do Vietnã vem dedicando tempo e recursos para avaliar os desafios relativos à Educação.

O país criou um plano de Educação de longo prazo e parece estar disposto a destinar o financiamento que for necessário para atingir seus objetivos.

Quase 21% de todos os gastos públicos de 2010 foram dedicados à Educação, uma proporção muito maior do que em qualquer país membro da OCDE – o clube dos países mais desenvolvidos do mundo.

Os educadores do país também criaram um plano de estudos que busca fazer com que os alunos desenvolvam um conhecimento mais profundo de conceitos centrais das diversas disciplinas e um domínio das habilidades básicas.

É fácil entender a razão de muitos destes estudantes vietnamitas terem se sobressaído nos testes ao se comparar alunos da Europa e da América do Norte, onde as escolas costumam abordar muitos assuntos, mas aprofundando pouco.

Além da memorização

O modelo vietnamita de Educação espera que os estudantes, ao terminar os estudos, não apenas sejam capazes de recitar o que aprenderam, mas também aplicar estes conceitos e práticas em contextos que não sejam familiares.

Nas aulas ministradas no país há um nível impressionante de rigor, com professores que desafiam os estudantes com perguntas difíceis.

Os professores se concentram em ensinar poucas coisas bem e com uma grande coerência, algo que ajuda os estudantes a avançarem.

E os mestres vietnamitas são muito respeitados, tanto na sociedade como em sala de aula. Isto pode ser um atributo cultural, mas também reflete o papel que é dado aos professores no sistema educativo, que vai mais além de dar lição na escola e também engloba funções de apoio ao estudante e preocupação com seu bem-estar.

No país é esperado que os mestres invistam em seu próprio desenvolvimento profissional. Eles também trabalham com um alto grau de autonomia.

Além disso, os professores de Matemática, especialmente os que trabalham em escolas desfavorecidas, recebem mais formação profissional que a média dos países da OCDE.

Alunos fora da escola

Estes professores sabem como criar um ambiente de aprendizagem positivo, fomentam a disciplina em aula e ajudam a construir atitudes positivas dos estudantes em relação à Educação.

E isto sem esquecer o estímulo aos pais, que geralmente têm grandes expectativas em relação aos filhos, e o fato de que a sociedade vietnamita dá muito valor à Educação e ao trabalho duro.

Mas, cerca de 37% dos vietnamitas de mais de 15 anos não estão escolarizados e o desafio agora é conseguir colocá-los na escola. Os resultados da prova PISA, baseados nos jovens que vão à escola e estão dentro do sistema educativo, não dizem nada sobre esses outros jovens não escolarizados.

O governo já estabeleceu como prioridade escolarizar todos os jovens e, até o momento, o sistema conseguiu absorver as crianças desfavorecidas e dar a elas acesso equitativo à Educação.

Quantidade X Qualidade

Mas, conseguir manter a qualidade é mais difícil que aumentar a quantidade, e o Vietnã terá que ter cuidado para não perder a qualidade conforme amplie o acesso à educação.

Assim como mostram os países que têm melhores desempenhos no setor, a excelência geralmente está associada à mais autonomia para as escolas, para que elas determinem seus planos de estudo e provas.

Para o Vietnã isto significa que o governo terá que encontrar uma forma de equilibrar uma gestão centralizada com um entorno flexível e autônomo para cada escola.

Para colher todos os frutos do investimento na Educação, o Vietnã precisa mudar não apenas a oferta de conhecimento, mas também a demanda.

Como sugere um informe recente, o Vietnã pode ganhar três vezes seu PIB atual até 2095 se todas as crianças comparecerem à escola secundária e todos eles adquirirem pelo menos conhecimentos básicos em Matemática e Ciências até 2030 – e se o mercado de trabalho do país for capaz de absorver e utilizar todo este talento.

Se o Vietnã não criar uma demanda para quem tem mais conhecimentos, o país corre o risco de que os mais qualificados escolham desenvolver seus talentos em outro lugar.

É necessário levar em conta uma possível liberalização do mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que o país se esforça para construir uma força de trabalho mais capacitada.

Talvez seja muito pedir para um país e seus cidadãos, mas o Vietnã já demonstrou que está pronto e, o que é mais importante, está disposto e ansioso para aceitar o desafio e superá-lo.

*Andreas Schleicher é Diretor de Educação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) 


Fonte: Pragmatismo Político

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