quarta-feira, 24 de maio de 2017

Governo Temer: uma tragédia anunciada


Eron Bezerra *

Qualquer que seja a manobra política ou jurídica a que Temer recorra para se manter no cargo será apenas para prolongar a sua própria agonia. Seu “governo” chegou ao fim e, felizmente, sem conseguir viabilizar integralmente a agenda do golpe: parar as investigações, entregar o patrimônio público ao capital privado e retirar direitos sociais e trabalhistas do povo.


Era uma tragédia anunciada, a hipótese mais provável, que finalmente se impõe como a única saída capaz de assegurar um mínimo de estabilidade política a esse extraordinário país que, sob qualquer critério, figurará entre as 10 nações mais importante do planeta.

Apenas os incautos, arrivistas e metafísicos sem capacidade de análise crítica teimavam em não enxergar o que parecia óbvio: nenhum presidente sem votos conseguirá governar um país com a complexidade do Brasil, salvo numa ditadura militar clássica.

Tive a oportunidade, como Secretário Nacional de Ciência e Tecnologia do MCTI, em Brasília, de apresentar essas ponderações a vários interlocutores que defendiam o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff sob o argumento que ela havia perdido as condições básicas de governabilidade.

Pacientemente eu explicava que, de fato, a governabilidade do governo Dilma estava bastante comprometida, especialmente pela falta de apoio no congresso nacional e no mundo empresarial. Sem mencionar o império americano, sempre atento e operoso para se livrar de qualquer governo com tintura progressista, por mais superficial que seja. Diante desses argumentos eu simplesmente os lembrava que se a presidenta Dilma, que contava com apoio da maioria dos movimentos sociais, estava com dificuldade de governar, o que não seria de um governo sem apoio e sem diálogo nesse segmento.

E, ao mesmo tempo, ponderava que a aventura golpista levaria o país a um impasse, na medida em que o cenário mais provável era o novo governo ter apoio do parlamento, dos empresários e até contar com a boa vontade do império americano, mas perderia completamente a interlocução com os movimentos sociais, não apenas pela ausência de base real nesses segmentos, mas, principalmente, pela agenda de supressão de direitos sociais e trabalhistas que eles já anunciavam abertamente. Pelos menos nesse aspecto ninguém foi enganado. Quem apoiou o golpe sabia que era para fazer isso.

Aconteceu exatamente isso. Temer obteve uma grande bancada parlamentar acrítica, disposta a votar em suas barbaridades; o judiciário jamais lhe impediu de nomear ministros envolvidos em processos de corrupção; contou com o apoio dos empresários até mesmo quando ele anunciou aumento de impostos e foi tratado, até recentemente, com extrema generosidade pelos meios de comunicação.

Dispondo desse aparato ele se lançou, com voracidade, para executar a agenda golpista: entregou bens públicos ao capital privado; aumentou a lucratividade dos banqueiros e especuladores e enviou para o congresso as principais reformas antipovo, especialmente a trabalhista e previdenciária.

Mas, como era previsível, quanto mais ficava evidente o caráter nocivo dessas medidas, mais o povo lhe rejeitava. Ausência de apoio popular, associada ao fato de que ele não conseguiu parar as investigações, fez com que sua base parlamentar começasse a apresentar crescente incômodo e dificuldade para votar essas medidas, em decorrência do estrago eleitoral previsível às vésperas da eleição geral de 2018.

A delação da JBS foi apenas o detonador que faltava. Poderia ser qualquer outro fator. Até então a maioria das delações eram de “ouvi dizer”. No caso dessa operação há provas documentais como jamais se viu numa operação equivalente.

Se juridicamente a situação de Temer é insustentável, imagine na esfera política. Como um parlamentar vai amarrar o seu futuro a um “governo zoombi”? Se era muito difícil ele conseguir votos para aprovar a reforma da previdência, nesse atual cenário eu ousaria dizer que é impossível.

E agora a conta chegou. Para a elite que bancou o golpe um governo que não consegue emplacar a sua agenda, não serve para nada, deve ser descartado. Esse é o destino de Temer nessa tragédia anunciada. A sua manutenção seria de total inutilidade, tal qual o mito de Sísifo que passou a vida inteira rolando uma pedra morro acima sem nunca poder concluir a tarefa, o chamado trabalho inútil.

Assim, a primeira medida é afastar Temer. Essa medida pode ser pelo impeachment (muito longo), por decisão do STF por crime comum (igualmente demorado) ou pela cassação via TSE, cuja sessão está marcada para o dia 06 de junho, sendo, portanto, nesse momento, o caminho mais curto para iniciar a solução do impasse.

Mas, qualquer que seja a opção, o povo deve ser chamado para opinar sobre qual é a melhor saída. Penso eu que apenas Diretas Já será capaz de apaziguar o país. Quanto aos óbices legais, insisto que impasses legais se resolvem politicamente.
* Professor da UFAM, Doutor em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia, Coordenador Nacional da Questão Amazônica e Indígena do Comitê Central do PCdoB.

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