segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Afrânio Jardim: Não há sociedade capitalista sem corrupção endêmica



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Há corrupção em sociedades não capitalistas, mas não há sociedades capitalistas sem corrupção endêmica.

Quase não são criticados os empresários corruptores. Pelas suas delações, chegam até a serem “venerados”. Os Procuradores da República da Lava Jato costumam dizer que a corrupção mata, mas os empresários corruptores eles deixam em prisão domiciliar …

Quase ninguém denuncia o perverso sistema econômico que serve de “pano de fundo” para toda esta corrupção.

Na verdade, estes corruptos não furtavam as chupetas dos bebês vizinhos nos berçários da maternidade onde nasceram… O que terá acontecido com eles???

O ser humano é produto não só dos fatores endógenos, mas também dos fatores exógenos. Como disse o grande pensador Ortega Y Gasset, “eu sou eu e as minhas circunstâncias”.

O fato é que o “poder econômico” sequestrou o Estado Brasileiro e a grande mídia é um de seus instrumentos. O nosso Poder Judiciário é complacente com tudo isso. A maioria de nossos juristas se ausenta deste debate. Estão mais preocupados com suas teses “mirabolantes” e desconectadas da realidade e com seu sucesso pessoal do que com as questões mais amplas, com as questões de interesse da sociedade. O individualismo é “epidêmico” em nosso país …

O “poder econômico” se faz sentir em todos os poderes do Estado e em toda a nossa vida. Este modelo de sociedade nos faz de “idiotas” a serviço da cobiça de uns poucos.

Somos todos, cada vez mais, consumidores compulsivos que, para comprar, vendemos nossa força de trabalho para quem nos vende estes mesmos produtos e serviços. Somos “massa” de manobra neste “círculo vicioso”.

Nesta sociedade de massa e de consumo, não mais somos o que poderíamos desejar ser. Somos o que o “mercado” nos faz ser.

Somos “reféns” de uma organização social perversa, hipócrita, individualista, egoísta e desumana. Nunca vi tanto cinismo nos meios de comunicação.

Nossos valores de igualdade, solidariedade, liberdade social, educação crítica e justiça social estão indo, cada vez mais, “para o espaço”.

Por vezes fica a impressão de que temos de “jogar a toalha” e nos adaptar a esta desprezível sociedade, formada por pessoas incultas, raivosas, preconceituosas e até ingênuas. Acho que não consigo. Não estou conseguindo… Não quero me render !!!

Entretanto, as corretas ideias e as melhores teorias sociais não podem ser rejeitadas pela fracasso humano de bem aplicá-las.

Outrora, ficávamos na seguinte dúvida: virá um novo homem que criará uma nova sociedade, ou, primeiro, virá uma nova sociedade, que forjará o surgimento de um novo homem?

Hoje ficamos com a impressão de que veio sim uma velha sociedade, que ressuscitou um homem pretérito, trazendo de volta uma antiga e primitiva cultura, lastreada em valores reinantes em períodos próximos do século XIX.

Cada vez mais, somos menos humanos e mais instrumentos de um sistema econômico e social que ninguém entende e que ninguém consegue deter. Estamos sendo levados por um verdadeiro furacão tecnológico …

Em resumo, ouso dizer que existe corrupção em sociedades que adotam outros modelos que não o capitalismo, mas não há sociedade capitalista sem corrupção disseminada.

O poder econômico é inerente à própria sociedade capitalista. A corrupção é inerente ao próprio poder econômico.

Em algum momento, teremos que lograr uma outra forma de organização social, onde todos tenham, ao menos, as mesmas oportunidades de ascensão social e tenham as suas individualidades respeitadas.

Espero que meus netos participem da construção desta sociedade sem explorados e exploradores; sem corruptos e corruptores.



*Afranio Silva Jardim, professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal. 

Fonte: Facebook do autor

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