domingo, 15 de novembro de 2015

Perfil: quem é Camila Lanes


Aos 19 anos, a estudante de São José dos Pinhais (PR) se torna presidenta de uma das mais tradicionais entidades do movimento social brasileiro
   

O 41° Congresso da UBES, que aconteceu entre os dias 12 e 15 de novembro em Brasília, elegeu para a presidência da entidade a paranaense Camila Lanes, 19 anos, presidenta da União Paranaense dos Estudantes Secundaristas (UPES). Camila substitui a carioca Bárbara Melo, que esteve à frente do movimento secundarista entre 2013 e 2015.
Leia abaixo perfil completo da nova presidenta da UBES, Camila Lanes.
“MÃE, VOU SAIR DE CASA”: QUEM É CAMILA LANES

“Mãe, vou sair de casa”, disse uma menina de 16 anos a sua mãe na cidade de São José dos Pinhais (PR), região metropolitana de Curitiba. O ano era 2012, um antes daquele que mudaria definitivamente a recente a história do país. A menina era uma adolescente de personalidade forte, que já ansiava transformar as coisas à sua volta. Estava decidida a se mudar para um acampamento do movimento estudantil na capital paranaense. A mãe era outra jovem, com apenas 36 anos, professora, solteira. A resposta dela ao pedido da menina impactaria não só a vida daquela família, mas de muitas outras.
Hoje, apenas quatro anos depois, Camila Lanes, 19, filha de Roseli Lanes, vinda do Colégio Estadual Silveira da Motta, transforma-se na principal liderança dos 40 milhões de estudantes do ensino fundamental, médio e técnico de todo o Brasil. A ascensão vertiginosa em direção à presidência da UBES começou com o apoio da mãe que, além de permitir a mudança radical da jovem, também passou a visitar o acampamento, a levar lanche para os jovens que estavam ali como ela, a ajudar da forma que pudesse: “Na verdade ela se tornou a mãe de toda a galera”, brinca Camila.
A causa era importante: recuperar a sede da União Paranaense dos Estudantes Secundaristas (UPES), no bairro do Juvevê em Curitiba, que tinha sido destruída por uma empreiteira e cujo terreno estava ameaçado pela especulação imobiliária. A jovem, que já tinha sido presidenta do grêmio da sua escola, imergiu-se até o pescoço no movimento. Após 136 dias, o acampamento saiu vitorioso e, em seguida, Camila foi eleita presidenta da UPES. O mundo tornava-se maior para a menina que, há pouco tempo atrás, lutava somente pela reforma da quadra e dos banheiros estragados do colégio.
O horizonte dos sonhos se deslocava então para a aprovação do Plano Nacional de Educação no Brasil, para a conquista dos 10% do PIB para o setor, o passe livre, as políticas públicas de juventude. Começou a viajar para outros estados e a participar mais ativamente do movimento estudantil nacional, ocupando espaços, liderando, mobilizando.
Em junho de 2015 viveu seu primeiro grande choque: foi ferida na trágica passeata dos professores e estudantes do Paraná que protestavam contra o pacote de medidas do governador Beto Richa e que foram violentamente massacrados pela Polícia Militar: “Fui ajudar um colega que estava desmaiado e acabei atingida por um estilhaço de bomba na perna”, relata mostrando a cicatriz.

A geração de Camila no entanto, não parece ser do tipo que se intimida com qualquer estrondo. A filha de Roseli representa o movimento de estudantes brasileiros que estão demostrando ousadias inimagináveis para sua pouca idade. Alguns deles estão agora bravamente ocupados nas escolas de São Paulo, resistindo de forma radical à decisão do governo do estado de fecha-las, deixando suas casas como ela também fez.
Um dia antes de ser eleita presidenta da UBES no congresso da entidade em Brasília, chegou a notícia de que houve violência policial em algumas dessas ocupações, com estudantes feridos: “Eles se iludem ao achar que isso diminuirá a nossa determinação. Não terão sossego. Ninguém vai fechar nossas escolas em São Paulo ou em qualquer lugar do Brasil”, promete.
Além da mobilização máxima das ocupações em SP, ela destaca três objetivos imediatos da sua gestão na entidade: lutar pela implantação do Plano Nacional de Educação e dos planos estaduais e municipais, garantir o direito dos secundaristas à meia-entrada nos eventos culturais, a partir da nova lei nacional sobre o tema, e conseguir a reformulação do ensino médio no país: “A escola brasileira hoje não é dinâmica, não é democrática, não dialoga com a atual realidade dos jovens, precisamos de um outro modelo”, defende.
Camila se declara uma jovem sintonizada com um país em mudanças. Acredita no fortalecimento da democracia e torce o nariz para os movimentos golpistas que se apresentaram neste ano de 2015 pedindo a interrupção do governo legitimamente eleito da presidenta Dilma Rousseff: “A juventude não cai nessa” diz.
Feminista, defende a legalização do aborto e a participação cada vez maior das mulheres na política. É contra a redução da maioridade penal porque, em sua opinião, é uma medida que só prejudica ainda mais a juventude negra e pobre excluída nas periferias do país. Também se coloca contra o Estatuto da Família, em votação no Congresso Nacional, e todas as formas de LGBTfobia. “Temos que levar esse debate pra dentro de escola”, opina.
No tempo livre, se diverte com os amigos na roda de conversa ou violão da rua São Francisco, o maior ponto de encontro da juventude de Curitiba. Gosta de rock nacional e MPB, é fã de Legião Urbana, Elis Regina e diz que se está se “aprimorando” no gosto pelo samba desde que entrou mais fortemente para o movimento estudantil.
No dia de sua eleição na UBES, a mãe não estava presente: “Ela é voluntária em uma escola da cidade e teve uma atividade no mesmo dia”, conta com o coração apertado. No entanto, agora a distância entre as duas já assusta menos. Camila saiu de casa mas, deixou ali o orgulho de estar fazendo a diferença para todo um país.

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