terça-feira, 13 de dezembro de 2011
Foco ambiental: A mulher e a água
Minha experiência recente com estudos sobre as possibilidades de abastecimento de água para populações rurais difusas, particularmente a partir de nascentes, tem me mostrado o papel da mulher na economia da água em pequenas propriedades de agricultura familiar. É ela que geralmente vai buscar água para dentro de casa, coando o líquido com um pano e armazenando a água de beber em jarra. Muitas vezes, administra a escassez porque precisa garantir também uma reserva para o cozimento dos alimentos, o banho da família e a higiene diária da moradia.
Faz ela com a água o mesmo que faz com os alimentos, adotando práticas de economia doméstica.
Gilberto Freyre em Casa Grande e Senzala afirma que, quando o português chegou por aqui no século 16, o homem indígena era provedor do alimento para a sua tribo, enquanto a mulher índia é quem ia buscar a água nos rios e nas fontes, evidenciando-se que essa função de gênero foi mantida por muito tempo no Brasil.
Ainda hoje é comum em países pobres do mundo que mulheres e meninas se desloquem longas distâncias para buscar água para fins domésticos. Segundo o Fundo de População, uma Agência de Cooperação Internacional das Nações Unidas, elas se deslocam a pé em média 6 km por dia, transportando cerca de 20 litros de água. Por vezes, andam até oito horas para alcançar uma fonte confiável, devido à escassez e à contaminação das águas.
Essa relação com a água e com o cuidado do núcleo familiar parece ser intrínseco à mulher a partir da própria gestação, em que o primeiro berço, antes do nascimento do bebê, se estabelece em uma bolsa de água morna dentro de si, confortável e acolhedora.
Naturalmente que esse cuidado com a segurança familiar extrapola à lida com a água, tanto que o Governo Federal escolhe a mulher para creditar o Bolsa Família e titula a propriedade rural da reforma agrária em seu nome.
Mas, se a mulher tem toda esta relação com a economia da água, como será a sua participação nas políticas de gestão hídrica? Nesse ponto, ainda se estabelece a predominância do homem nos papéis de decisão ou de maior influência.
Para configurar melhor essa situação, fiz alguns levantamentos que considero oportunos, junto a colegiados gestores de água. Na composição do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, verifiquei que somente 28% dos conselheiros titulares são mulheres; algo pior ocorre no Conselho Estadual de Recursos Hídricos de Pernambuco, em que as mulheres respondem por apenas 18% dos membros. Para tirar a prova, fui checar a composição de gênero no Comitê Federal da Bacia do Rio São Francisco, em que 82% são homens. Parecido, mas um pouco melhor, encontrei no Comitê Estadual da Bacia do Rio Capibaribe, em que a presença de homens é de 74%.
Como se vê, apesar das mulheres serem íntimas da água, ainda falta um bocado para que ocupem o lugar justo na macrogestão dos recursos hídricos.
Por Ricardo Braga
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