sexta-feira, 1 de julho de 2016

Estrangeirização: PL ruralista é rebatido por movimentos e economistas



A lógica do agronegócio é prejudicial ao alimento que chega na mesa do brasileiroA lógica do agronegócio é prejudicial ao alimento que chega na mesa do brasileiro

No dia 20 de junho, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, afirmou que o presidente interino Michel Temer mandará uma mensagem ao Congresso Nacional propondo liberar a venda de terra para estrangeiros. Na entrevista, Maggi afirma que muitas empresas deixam de investir no Brasil porque não podem dar terras como garantia a bancos estrangeiros.
“Uso a própria lógica do ministro interino: se uma empresa, pessoa ou país detém 2 ou 3 milhões de hectares cultivados e, de um ano para outro, decidir não cultivar aquela área por simples cálculos financeiros de custo-benefício, isso resultará em grandes impactos para a produção do país”, exemplifica o professor do Programa de Pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural da Universidade de Brasília (UNB) Sérgio Sauer.
Contra a ideia de que esse tipo de investimento poderia aumentar a produtividade, Sauer lembra que no setor sucroalcooleiro, que passou por intensa internacionalização na produção, isso não ocorreu. “Não aumentou a produção porque os investidores compraram a capacidade já instalada das usinas em operação, portanto, aconteceu uma "trocada de mãos" do setor e - se não estou enganado - mais de 60% da produção está em mãos de empresas estrangeiras ou em consórcios com capital externo”, argumenta.
“É a lógica do grande agronegócio, mas é um exemplo simples da perda da autonomia. Ainda, em termos econômicos, na lógica de mercado, promover a demanda significa aumentar preços. Portanto, as terras tendem a ficar mais caras tanto para investidores nacionais e estrangeiros quanto para a execução das políticas de Reforma Agrária. Além de aprofundar a dependência dos preços internacionais das commodities, essa lógica gera insegurança alimentar, pois a produção é para exportação de soja, por exemplo, sendo que o Brasil tem que importar feijão para abastecer a demanda nacional”, acrescenta o professora da UNB.
A avaliação é acompanhada pelo economista Guilherme Delgado, que estuda políticas agrícolas “Isso tem consequências de diversas naturezas. As pessoas jurídicas estrangeiras que compram terra aqui evidentemente compram ativos, patrimônios, participações acionárias, sem nenhum compromisso com a produção ou ocupação. Isso depende de outras decisões de investimento que realmente escapam a esses titulares estrangeiros, normalmente fundos de pensões, grandes sociedades que estão ligadas às cadeias do agronegócio”, afirma.
Ele também enfatiza os a riscos da soberania do país, especialmente nas terras em regiões de fronteira. “O mercado de terras em todo o mundo é um mercado de bases nacionais no mundo inteiro. Não se internacionaliza isso porque ele também está ligado a soberania.
Então eu vejo com preocupação essa tese ‘liberou geral’. Além do que as pessoas físicas e jurídicas de outros países, mais até que as brasileiras, não têm compromisso com a função social da terra”, pondera.
Temer deve apoiar a aprovação do PL 4059/2012, de autoria da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, cuja maioria dos parlamentares representa os interesses do agronegócio.
O PL tramita em regime de urgência, mas está parado desde setembro do ano passado. O projeto está apensado a outro, o 2289/2007, de autoria do deputado Beto Faro (PT-PA), que trata do mesmo assunto, mas em vez de liberar completamente a compra por estrangeiros, regulamenta a legislação vigente.
Até 1998, uma lei de 1971 permitia que empresas com sede no Brasil comprassem terras no país. Naquele ano, a Advocacia Geral da União interpretou que empresas nacionais e estrangeiras não poderiam ser tratadas de maneira diferente e liberou a compra.
A mudança teve impacto imediato e milhares de alqueires foram vendidos a empresas de capital estrangeiro. Diante do avanço da estrangeirização, um novo parecer da AGU em 2010 restabeleceu restrições para esse tipo de propriedade.
“Nós da Contag [Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura] somos contra [essa mudança]. Porque ela pode significar três coisas. A primeira é que se pode perder a soberania nacional no momento em que você começa a vender seu solo e aquilo que tem debaixo, que são as riquezas naturais que temos; a segunda é que o Brasil já é um dos países mais injustos em distribuição de terras.
Somos um país concentrador. Significa dizer que vender as terras indiscriminadamente vai concentrar. E a terceira, que nos pega em cheio, é que vai dificultar ainda mais a reforma agrária, porque pode encarecer enormemente os preços”, elenca o presidente da Contag, Alberto Ercilio Bloch.
 


Gisele Brito, da página do MST

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