sábado, 29 de novembro de 2014

Eleição no Uruguai: Processo democrático latino-americano está em jogo

Rony Corbo é secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista do Uruguai.
Rony Corbo é secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista do Uruguai.

No domingo (30), os uruguaios elegerão o próximo presidente. Dois projetos estão em disputa: Tabaré Vázquez, da Frente Ampla, que deve dar continuidade ao processo democrático progressista,versus Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional, que segue a linha neoliberal herdada de seu pai. O Portal Vermelho conversou com Rony Corbo, membro da Comissão de Relações Internacionais do Partido Comunista do Uruguai, que comentou a expectativa para o pleito.

Por Théa Rodrigues, da redação do Portal Vermelho


Através do PC do Uruguai, Corbo integra a coalizão governamental Frente Ampla, que concorre ao terceiro mandato consecutivo no país. Em entrevista exclusiva, ele traça um perfil dos candidatos à presidência e confirma o favoritismo de Vázquez. Para o comunista, a grande preocupação é o retorno à um passado neoliberal.


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Corbo é otimista e confia que, nas urnas, o povo irá reconhecer os êxitos alcançados nos últimos dez anos de governo. Segundo ele, ainda há muito para ser feito no país e é preciso aprofundar as conquistas, além de pensar nas mudanças estruturais. Confira a íntegra da conversa:
Portal Vermelho: Qual a expectativa para o segundo turno das eleições uruguaias, que acontecem neste domingo (30)?

Rony Corbo: Estamos em um processo eleitoral no qual se disputa a continuidade de um projeto democrático, com Tabaré Vázquez, ou o retorno do neoliberalismo no Uruguai, com Lacalle Pou. Lacalle Pou é uma figura jovem, um típico playboy, filho de um ex-presidente neoliberal dos anos 1990 [Luis Alberto Lacalle 1991-1995]. Originário, portanto, da oligarquia uruguaia.

A tendência das enquetes indica a vantagem de Vázquez, que é bem conhecido, pois presidiu o país de 2005 até 2010, e agora busca um novo mandato com a coalizão de esquerda Frente Ampla (FA), do atual mandatário, José Mujica. 

Nós do Partido Comunista do Uruguai, como parte da fórmula da FA, fizemos uma sólida campanha por todas as localidades do país e nosso termômetro é a mobilização popular. Estamos trabalhando conscientes do risco que corre o nosso projeto, mas confiamos nas gestões anteriores, tanto de Tabaré, quanto de Mujica, que foram muito exitosas.

O que esperamos é que o povo de nosso país, no momento de votar, veja, se conscientize e não queira mais regressar ao passado neoliberal. Apostamos que aquilo que fizemos será reconhecido pelos uruguaios, caso contrário, a população perderá muito.

Lacalle Pou e Tabaré Vázquez disputam a presidência do Uruguai. Foto: AFP
O Uruguai avançou bastante com as políticas progressistas dos últimos dez anos, mas em sua opinião o que ainda falta ser feito?

A Frente Ampla é uma coalizão política formada por 28 partidos, temos todos os partidos de esquerda reunidos. Sou membro do Partido Comunista e, no meu ponto de vista, ainda falta aprofundar o processo democrático e aproximá-lo das mudanças de fundo estruturais.

Consolidar a Lei de Meios é uma das medidas urgentes, pois é necessário limitar o monopólio dos meios de comunicação que, no Uruguai, estão nas mãos de quatro famílias. Essa é uma dívida pendente que temos e acredito que o mesmo ocorre no Brasil. Em relação à notícia, uma coisa é o que você faz como governo, outra coisa é o que e como se comunica. Este é o nosso “calcanhar de Aquiles”, porque prejudica muito a informação. Só conseguimos amplificar as nossas conquistas e avanços através dos “meios de comunicação amigos” ou da mídia alternativa.

Também precisamos pensar em mudanças mais profundas como a questão tributária que ainda nos faz pagar 30% de imposto sobre o nosso salário. Isto é uma grande contradição para um governo progressista.

Quais medidas da Frente Ampla você destacaria como principais avanços do país?

Conseguimos aprovar a lei da legalização da compra, venda e cultivo da maconha sob a supervisão do Estado, que é uma medida marcante de combate ao narcotráfico no continente, uma vez que a chamada “guerra às drogas” fracassou. O Uruguai também se converteu no segundo país latino-americano a aprovar o matrimônio igualitário. Em 2012, o país despenalizou a interrupção da gravidez até a 12ª semana de gestação, desde que se cumpram certos procedimentos médicos também regulados pelo Estado. Ou seja, são medidas fortes para a América Latina, que mostram a capacidade de nosso país, mesmo sendo tão pequeno, de reconhecer os direitos humanos dentro da diversidade.

Desde que a Frente Ampla assumiu o governo do Uruguai em 2005, tivemos muito o que comemorar. Conseguimos o mais alto nível de empregos da história do país; O salário mínimo aumentou 42%; conseguimos diminuir a pobreza e fomos reconhecidos pela Cepal como o segundo país com menor índice da região, pois tiramos mais de 850 mil pessoas desta situação; Melhoramos o Sistema Nacional de Saúde; Tivemos um crescimento importante nas exportações; Fortalecemos as iniciativas culturais; dentre outras coisas que não consigo me lembrar agora.

Qual o segredo do Uruguai para conseguir implementar tantos avanços?

Na política, uma coisa é a imposição, outra coisa é ter uma correlação de forças que te ajuda a seguir adiante. Tivemos a sorte, diferente do Brasil, de contar com a maioria parlamentária. Também soubemos trabalhar dentro da diversidade da esquerda, pois primeiro precisamos chegar a um consenso entre nós. Claro que temos nossos debates, acordamos o que é possível, pois se trata de uma diversidade dentro de uma unidade. 

Como você avalia o tema da integração, tema comum entre os governos progressistas da América Latina?

Outro tema que ficou pendente, na minha opinião, é o desenvolvimento do Mercado Comum do Sul (Mercosul), que enfrentou dificuldades. Temos que revitalizá-lo. O que queremos é que a América Latina siga sendo multicolorida e, oxalá, consigamos aprofundar esse processo que alguns chamam de “giro à esquerda” para consolidar a integração regional.

Reprodução
 


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