domingo, 22 de julho de 2012

Pelao Carvalho: dias de resistência no Paraguai

No Paraguai, estamos resistindo desde a manhã do dia 15 de junho, quando aconteceu a matança no distrito de Curuguaty. Resistência ao medo que a direita quis impor, resistência ao temor de uma esquerda muito cautelosa e imobilizada.

Por Pelao Carvalho*, especial para o
Portal Vermelho

     
Paraguai Mobilização em frente à TV Pública, principal foco da resistência na semana que se sucedeu ao golpe

Para não esquecer, resistimos também ao governo de Lugo quando, pressionado pelo Congresso Nacional, destitui seu ministro do interior, Carlos Filizzola e em seu lugar colocou um direitista do Partido Colorado, o ex-fiscal Candia Amarilla. Porque antes que aplicassem um golpe de Estado parlamentar em Lugo, o ex-presidente se deu um autogolpe entregando o governo ao Partido Colorado. E a isso resistimos também. Nesses dias saímos às ruas para nos solidarizarmos e expressarmos nosso repúdio ao massacre, e essa saída à rua foi difícil e angustiante. Havia no ar uma espécie de “ordem” da esquerda de não falar, não expressar, esperar. E a direita impunha sua opinião, sua verdade por meio da imprensa. Resistimos saindo às ruas nesses dias.

Durante o golpe estivemos dia e noite na rua. Terminado o golpe resistimos à frustração e levantamos a esperança e a luta na TV Pública. Depois, tudo tem sido resistir.

Hoje nossa resistência continua e continuará. Porque é nossa vontade. Mas não da mesma maneira até agora. Devemos ser um pouco mais pulsantes, mais incômodos, mais irritantes. Nossa resistência, até agora, salvo exceções, mais que pacífica, parece passiva, mais do que não violenta, parece invisível. Sem sair do marco da não violência e da desobediência civil, creio que podemos ser mais conflitivos e efetivos. Também podemos ser mais abertos e plurais. As ações de resistência até hoje estiveram muito centralizadas e em geral têm sido bastante tímidas. Se seguirmos por este caminho nossa resistência não morrerá pela repressão, mas de aborrecimento. Precisamos que a resistência floresça em milhares de ações: pequenas, medianas, grandes, gigantes. Que o conjunto do povo sinta que há resistência, ainda que isso incomode em seu cotidiano ou justamente porque vai molestar seu cotidiano. Devemos fazer da desobediência civil um cotidiano, do boicote uma ferramenta.

Faltam hoje alguns elementos para construir uma resistência mais efetiva. Vontade política, ferramentas pedagógicas, articulações para a ação e conhecimento de medidas de cuidado e logística mínima. A vontade política da esquerda parece mais discursiva que real hoje: dizem que resistem, mas… as ferramentas pedagógicas existem, mas não foram colocadas à disposição do povo… não circulam volantes, panfletos nem cartazes com mensagens que indiquem como e o que fazer para resistir. As articulações para a ação, por centralismo e temor da participação do povo, se reduzem à comunidade da esquerda de sempre, deixando muita gente fora disso. O conhecimento mínimo necessário também está restrito a grupos determinados da esquerda, negando ao povo a possibilidade de construir suas próprias ações de desobediência e resistência.

Se completarmos esses vazios, poderemos construir uma resistência que ao mesmo tempo seja pedagógica para ir construindo-nos como um povo consciente e com capacidade de gestar suas lutas e demandas. Mas é difícil vencer todas as falhas e obstáculos culturais de nossa esquerda paraguaia, sobretudo esse excesso de precaução ou temor que demonstra hoje.

O povo resistente pode evitar aquela esquerda que se mostra pusilânime e ineficaz seguindo o caminho de uma resistência que não causa problemas nem danos aos golpistas, que confunde pacifismo com ineficácia e não violência com passividade. É de esperar que a esquerda em seu conjunto não caia na tentação de deixar as coisas como estão. O cenário do cumprimento de um mês do golpe nos dá a oportunidade de sair fortemente às ruas de novo. Tem que estar claro que o povo que resiste somente encontrará seu próprio caminho de ação não violenta se a esquerda, em seu conjunto — além de seus núcleos e frentes que hoje parecem divididos, — não despertar e resistir de verdade e com consciência, fora dos escritórios, salas de reunião e câmeras fotográficas e de TV: na rua. A resistência ativa deveria ser considera um espaço de construção de unidade na rua.

*Pelao Carvalho é jornalista paraguaio.


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