A cobertura das manifestações pró-impeachment realizada pela grande imprensa não poupou elogios ao que foi considerada a grande "festa da democracia". Curioso observar o uso das palavras "festa" e "democracia".
Por Jorge Henrique da Silva Romero*
A Paulista vermelhou com vitória de Dilma em 2014.
Vladimir Safatle respondeu com boa ironia em sua coluna no jornal Folha de São Paulo, no dia 17 de março, ao afirmar que: “E eu que achava que festas da democracia normalmente não tinham cartazes pedindo golpe militar, ou seja, regimes que torturam, assassinam opositores, censuram e praticam terrorismo de Estado”.
No entanto, sempre que há deslocamentos políticos arbitrários a imprensa garante seu ingresso na festa ao armar a arquitetura discursiva das forças totalizantes. No golpe de 1964 que empossou Castelo Branco, a imprensa considerou sua "posse" como uma verdadeira "festa" comemorada por todo o Brasil, que observava atentamente o “ressurgimento” da democracia subtraída.
O Estado de São Paulo também não deixou de lado seu incondicional apoio ao novo regime e declarou: "Democratas dominam toda a nação". Nesse sentido, é sempre bom lembrar uma frase do escritor português José Saramago, que numa entrevista a El Correo de Andalucía afirmou que “O grande problema do nosso sistema democrático é que permite fazer coisas nada democráticas democraticamente”.
Essas imagens parecem representar o mais puro e banal conceito de espetáculo, que consiste na manipulação de discursos para legitimar democraticamente as posições mais antidemocráticas possíveis. O mais engraçado é que alguns meses atrás a "festa da democracia" não parecia ser outra coisa senão a eleição presidencial, que me parece foi vencida por Dilma Rousseff.
*Jorge Romero é linguista, mestre em Teoria e História Literária pela Unicamp e autor do livro “As formas da Inspiração: linguagem e criação poética em Patativa do Assaré”.
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