quarta-feira, 18 de março de 2015

Luís Fernando Vitagliano: De panela cheia e discurso vazio


Sem fatos claros, o que justifica o fim do governo? Sua impopularidade? Ou o número de panelas batendo depois do discurso oficial em rádio e TV? A oposição joga para mobilizar manifestações contra uma suposta paralisia ou incompetência do governo.

Por Luís Fernando Vitagliano*, publicado no Brasil Debate


 
 

Qual é o projeto da oposição para o Brasil? Desta oposição que não diz, mas corrobora com o pseudo golpe engatilhado. O que querem para o país? Por que se mobilizam? Para limpar-nos da corrupção? De toda a corrupção? Ou é basicamente livrar-se do PT? Se for isso, simplesmente por sumir o partido, daí nasce um novo Brasil?

Certamente é consenso que panelaço não é discurso. Seja como protesto, seja como estratégia. Por isso, a pergunta que importa não é quantas pessoas estavam na rua no domingo, mas por que questões mais gerais não aparecem no discurso da oposição, por exemplo, sua estratégia e sua crítica para o debate do crescimento econômico? Para isso vamos aumentar a concentração de renda e riqueza ou não? Propõe cortar gastos em infraestrutura e investimentos sociais?

E a Petrobras, a saída é privatizá-la? Assim como o Banco do Brasil e a Caixa? Deve retomar o alinhamento com os EUA e União Europeia ou manter o investimento que o governo vem fazendo na parceria com o BRICS? Será que no domingo se defenderá a criação do dia do Orgulho Hétero como alguns dos seus têm dito? E vai acabar com cotas, bolsas e aumentar a pobreza e a miséria?

Será que a oposição quer combater ou ignorar o fisiologismo político e sua dependência do capital econômico? Ou vai fazer como sempre fez? Ignorou… Vai separar pobres de ricos e manter a ordem da servidão? Ou propõe rever tudo que praticou em defesa da família, propriedade e tradição? A quem serve o panelaço e o discurso do ódio?

Sejamos claros, para discutir os problemas de conduta irregular e os desvios de dinheiro, temos leis, instituições independentes, estruturas e investigação. Nada está sendo censurado, obstruído ou pressionado para ser encoberto. Pelo contrário, há uma pressão enorme por esclarecimentos e transparência. Este é um Estado de direito. Mas, quem vai julgar os desvios na Petrobras, ou o quer que seja, deve ser o Supremo Tribunal Federal; não as elites econômicas, a oposição ou a imprensa.

Não serão e não podem ser os protestos vindos da varanda dos prédios ou a queda de popularidade do governo que vão nos levar ao impedimento da presidenta. Cabe ao judiciário responder com neutralidade aos casos de desvios de conduta ou descumprimento da lei.

Mesmo porque a vitória de Dilma e do PT foi constituída já com a operação Lava Jato em curso e as denúncias e debates sobre a Petrobras com o agravante de vazamento de informações ou, como querem os mais exaltados, com criação de falsos factoides.

Quanto a isso, ninguém foi pego de surpresa em relação ao problema da Petrobras com as empreiteiras. A partir dos resultados das urnas, respeitados os processos da democracia, isso não foi visto pela maioria da população como suficiente para destituir Dilma da Presidência. Pelo contrário: votou-se majoritariamente por sua recondução.

E não foi o nome da presidenta o envolvido nas delações. Pelo contrário, o mencionado nos noticiários de hoje é o nome do seu principal concorrente. Exatamente o contrário do apresentado por uma revista semanal que circulou como panfleto antipetista em outubro.

É óbvio que agora, depois das urnas, há uma nova cruzada antigoverno. Desta vez mais perigosa e mais arriscada, porque também é uma investida contra o Estado democrático de direito: a oposição tenta um processo de judicialização da política para paralisar o governo e suas ações, seja para defini-lo como incapaz, incompetente, seja para aplicar o golpe de impedimento da presidenta.

Sem fatos claros, o que justifica o fim do governo? Sua impopularidade? Ou o número de panelas batendo depois do discurso oficial em rádio e TV? A oposição joga para mobilizar manifestações contra uma suposta paralisia ou incompetência do governo.

Mas o apelo é ridículo: nunca antes na história desse País vídeos amadores de janelas (numa proporção pouco significativa em termos numéricos) representou tanto para a grande mídia. Para desestruturar o governo, a oposição é quem força a impressão de paralisia. Fica a impressão de que o País está sem rumo e que a única alternativa digna é tirar o PT do governo. É uma estratégia, que mais uma vez não mostra nenhuma proposta.

A pergunta real e que importa é: qual é o projeto dessa oposição para o Brasil? Se partidos e políticos que a representam são tão bons assim, por que não defenderam seu plano de governo e por que não foi vitorioso em outubro passado? Por que a única via de ação da oposição é responsabilizar o PT por todos os contratos ilícitos encontrados, tenha o Partido envolvimento ou não?

A oposição, afinal, tem projeto para além das panelas e passeatas?

A resposta a essa pergunta é mais maliciosa que se possa parecer. Sim, a oposição tem projeto. Mas não, não pode dizê-lo claramente. Não pode dizer claramente porque o projeto da oposição é antidemocrático, concentrador de renda e riqueza, imperialista e sectário.

Por isso é necessário tratar da Petrobras, de corrupção ou de qualquer tema que não venha a discutir os encaminhamentos de governo. Porque o debate estéril sobre desgoverno é útil para atacar o projeto vencedor e tirar de foco verdadeiro projeto derrotado em outubro passado.

Obviamente a corrupção deve ser debatida, atacada e criticada. E deveria ser tratada a partir inclusive de uma ação suprapartidária. Mas, esse debate não interessa à oposição. Não como uma questão séria e republicana. São seletivos nos processos e nas críticas e tendo como alvo sempre o governo federal.

Não preciso gastar muitos argumentos para defender o que foi exposto. No cerne da corrupção deflagrada com o Lava Jato está a relação entre uma estatal e empresas privadas para o financiamento de campanha. Na proposta de reforma política que os partidos fisiológicos e de oposição defendem está a legitimação do financiamento privado de campanha.

Uma reforma política com vistas a combater a corrupção não pode ser a mesma que propõe a oposição porque é oposta à redução e combate a corrupção. E os políticos da oposição sabem disso. Mas, se a imprensa não noticia essas relações, o eleitor dito esclarecido acredita que ao atacar o PT está defendendo a ética.

Mais uma vez, não interessa o debate sério e de propostas. Mesmo porque, toda vez que fica claro o projeto de poder da oposição, suas propostas e seus interesses, ela é derrotada pela democracia. Porque suas ideias são ainda de um Brasil colonial, de dominadores e senhores de engenhos donos de casa grande circunscrita na desigualdade social e à custa de desvalorização, de precarização e de desregulação do trabalho dos mais pobres.

*Luís Fernando Vitagliano é cientista político e professor universitário

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