A invasão da Universidade de Brasília (UnB) por tropas do Exército completa 44 anos nesta quarta-feira (29). A UnB foi a instituição de ensino superior que mais sofreu durante o regime militar, na opinião do historiador José Otávio Nogueira Guimarães, coordenador de investigação da Comissão de Memória e Verdade Anísio Teixeira.
Cedoc/UnB Agência
Agentes da ditadura invadem a UnB para prender sete universitários
Invasão da UnB por agentes do regime militar completa 44 anos
Recentemente instalada, a comissão vem desenvolvendo o trabalho de apurar violações de direitos humanos e liberdades individuais na universidade, ocorridas entre abril de 1964 (golpe militar) e outubro de 1988 (promulgação da Constituição).Invasão da UnB por agentes do regime militar completa 44 anos
Guimarães acredita que a repressão teve forte impacto na UnB porque a instituição tinha um projeto inovador em termos educacionais, mas ainda era incipiente. Por isso, segundo ele, mereceu a desconfiança dos militares. “Não era uma universidade que estava ali há muito tempo, como a USP [Universidade de São Paulo]. Era uma universidade nova [em funcionamento há dois anos]. Face ao projeto original e aos quadros [de docentes] que Darcy Ribeiro tinha conseguido trazer, eu não tenho dúvida: ela foi a universidade mais atingida”.
O historiador lembra que no dia 9 de abril de 1964, nove dias depois do golpe, nove professores foram demitidos, além do reitor Anísio Teixeira e do vice-reitor Almir de Castro. As demissões foram feitas com base no Ato Institucional nº 1 (AI-1), que previa “investigação sumária”, com demissão e dispensa de funcionários públicos, contra quem tivesse “tentado contra a segurança do Pais, o regime democrático [sic] e a probidade da administração pública”.
Além das dispensas após o AI-1, 223 professores pediram demissão da universidade em setembro de 1965 por causa das intervenções. “Foi aquela diáspora”, comentava Darcy Ribeiro (morto em 1997), um dos idealizadores da UnB. Segundo ele, a instituição foi concebida “para cuidar das causas do atraso do Brasil”, mas mesmo antes do golpe já incomodava.
“Brasília não podia ter duas coisas: operários fabris fazendo greve e estudantes fazendo baderna”, disse Darcy Ribeiro, em depoimento registrado no documentário Barra 68,de Wladimir Carvalho, que retrata a invasão. Na invasão, um estudante foi baleado, 60 pessoas foram presas e 500 chegaram a ser detidas provisoriamente, junto com parlamentares, na quadra de basquete.
Invasão
A invasão ocorreu porque os alunos haviam protestado recentemente contra a morte do estudante secundarista Edson Luis de Lima Souto, no Rio de Janeiro. Um decreto determinava a prisão de sete universitários. Com a ordem, agentes das polícias Militar e Civil, do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e do Exército invadiram a universidade. “Ignorância militar era uma coisa absurda . A UnB incomodava por causa da maneira como foi idealizada”, pondera Cláudio Antônio de Almeida, então estudante de economia.
Almeida era amigo de Honestino Guimarães, aluno de geologia e presidente da Federação dos Estudantes Universitários de Brasília (Feub), um dos sete que tinham ordem de prisão decretada na invasão. Segundo o ex-aluno, Honestino foi levado em “cena de sequestro”. Ele lembra que estava tendo aula de política e programação econômica, com o professor Lauro Campos, morto em 2003, quando começou a ouvir gritos: “prenderam Honestino!”.
Na sequência, os alunos saíram correndo da sala de aula. “Fomos avisados de que um grupo de policiais saiu arrastando Honestino de maneira violenta, batendo nele, colocaram-no dentro de uma viatura e saíram dando tiros pela janela, até o próprio motorista”, relatou à Agência Brasil.
Combate à "subversão"
A invasão da UnB marcou uma mudança nas intervenções na universidade. A partir dali, o governo militar usou outras estratégias para combater o que considerava “subversão” acadêmica: entre elas, a exclusão de professores e estudantes de programa de bolsas, a produção de material contra docentes e depoimentos falsos. “O propósito era criar fatos para desmoralizar as pessoas e fazer uma limpeza na universidade”, analisa José Otávio Guimarães.
Segundo ele, há documentos no Arquivo Nacional que comprovam a atuação de agentes do Serviço Nacional de Inteligência (SNI) e do Serviço de Inteligência do Ministério da Educação para investigar alunos e professores.
Com esse material, Guimarães espera que Comissão da Verdade vá além de contar a resistência “heroica” à ditadura militar. Segundo ele, pode ser que se chegue a documentos que mostrem que ocorreu delação e que foram forjadas histórias sobre as pessoas. A comissão faz nesta semana sua segunda reunião fechada para definir prioridades.
Fonte: Agência Brasil
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