O desmoronamento da URSS e de vários países do bloco
socialista fez com que os actuais países com meta socialista – China, Laos,
Vietname, Coreia do Norte e Cuba – procurassem nas suas condições históricas e
filosóficas de resistência permanente às formas de domínio imperial o esteio
para prosseguir a luta pela autonomia nacional dentro das condições adversas do
sistema capitalista.
A destruição das potencialidades de desenvolvimento
económico autónomo dos países subdesenvolvidos pelo domínio colonialista e
imperialista despertou as nações latino-americanas para a necessidade de
construir a independência política. O conhecimento de cada realidade nacional
aponta o caminho de libertação inspirado naqueles que sobreviveram às pressões
externas dos predadores.
Perdeu-se o apoio de uma potência socialista – a URSS – que
enfrentava frontalmente a sua opositora capitalista – os EUA – que representava
a ponta de lança do imperialismo, e continuaram a suportar a pressão que vinha
de séculos de atraso e miséria herdados do colonialismo. Aquelas nações foram
mantidas em situação de pobreza extrema como as demais dos continentes da
América Latina, Ásia e África, infiltradas por espiões e provocadores de
distúrbios internos, recebendo a título de informação e cultura um lixo
selecionado pela grandes empresas de comunicação social, espoliados nos valores
de seus produtos e mão de obra exportados.
Tanto a cultura milenar do Oriente como o sofrimento secular
dos países subdesenvolvidos ensinaram aos povos a arte da guerrilha e a
conscientização das massas para criar um substrato resistente capaz de suportar
as dificuldades de vida, impostas pelas elites dominantes, sem
abandonar a formação do ser humano e o preparo
revolucionário para emergir diante do inimigo quando em crise sistémica. As
oito décadas de existência de uma potência socialista serviu de suporte ao
acesso a uma cultura moderna sem a censura da elite capitalista para que o
mundo
subdesenvolvido desenvolvesse as bases do seu conhecimento
da realidade e a consciência de um caminho revolucionário.
A colonização europeia iniciada no século XVI foi seguida
pelo neocolonialismo quando surgiram movimentos de independência nas nações
dominadas, e modernizada pelo neocapitalismo de versão democrática dentro do
espartilho do imperialismo tendo como instrumentos o Banco Mundial e o FMI.
Estes processos mantiveram os países subdesenvolvidos da América Latina, África
e Ásia afogados na pobreza e na dependência política e económica de um sistema
hostil à humanidade, que era considerado «civilizado e cristão» por ter
institucionalizado as fontes do saber científico e religioso nas suas nações
ricas do Ocidente que sugava as riquezas das colónias.
Os «impérios colonizadores» fizeram tábua rasa das nações
dominadas, sem reconhecer as culturas milenares do Oriente e de povos nativos
na África e no continente americano para dizimá-los e escravizá-los como se
fossem animais. Obtiveram grandes lucros com o comércio de seres humanos
espalhados por todo o mundo, espoliaram os seus patrimónios,
apropriaram-se dos seus conhecimentos, esmagaram as suas culturas e crenças
impondo o modelo institucionalizado nas universidades e igrejas, a ferro e
fogo.
Aos povos que resistiram com a força das suas comunidades
introduziram, sob a via das acções caritativas, as doenças contagiosas e as
drogas como vírus sociais – varíola na América e ópio no Oriente. Bem conhecida
ficou a Guerra do Ópio entre a China e o Império Britânico no século XIX.
Durante o século XX as experiências com produtos abortivos misturados ao leite
em pó doado a populações famintas no Brasil, ou que provocavam várias doenças
neurológicas através do abastecimento de água, foi denunciado por Fred Kennedy
pouco antes de ser assassinado nos EU. As redes internacionais de droga assim como
as formas mais variadas de corrupção de membros de
estados para manter o poder imperial dominante são uma
constante na vigência do sistema capitalista.
Sementes
Hoje ficamos surpreendidos com o crescimento da violência na
sociedade, da destruição dos valores humanistas, da unidade das famílias, dos
processos não concluídos contra altas personalidades que roubam milhões ao
Estado, com o apagamento da responsabilidade de mortes ocorridas nas praxes
académicas, com a utilização de cobaias humanas por famosos laboratórios
farmacêuticos, e tantas torturas mentais e físicas praticadas impunemente. Mas
isto sempre ocorreu durante a história do sistema capitalista desde a sua
origem colonialista.
A experiência socialista europeia sucumbiu ao poder
capitalista, mas deixou sementes nos países que souberam resistir adaptados à
sua história de pobreza gerida com integridade e convicção nos próprios valores
éticos e de independência. Os BRIC convivem com o sistema adverso por caminhos
diferentes que a história legou a cada um. A participação popular é fortalecida
na consciência da sua responsabilidade para enfrentar a luta ou aceitar a
escravidão. Os caminhos contornam os obstáculos desgastando as pressões que se
multiplicam sem perder de vista o rumo da liberdade.
Em Portugal, a Revolução de Abril teve as suas raízes na
luta clandestina popular durante o período da ditadura fascista. Ao contrário
de outras nações empobrecidas da Europa que também exerceram o poder colonial
como pontas de lança sob controle do domínio imperialista britânico,
desenvolveu-se uma consciência cidadã entre os trabalhadores, a
intelectualidade e as forças militares, que teve por meta a independência, o
fortalecimento autónomo das forças produtivas e a defesa intransigente dos
valores e do património nacional. A ambição de uma elite capitalista que
participou daquele processo revolucionário através do golpe militar e de uma
rápida adesão política às estruturas de poder recém formadas para conduzir o
País, serviu de fio condutor para que o imperialismo lançasse os seus «vírus»
para transformar o processo revolucionário numa modernização subordinada ao
centro económico e militar da Europa.
O governo de Vasco Gonçalves, no qual participou o PCP com
apoio do movimento sindical e das forças democráticas de ampla abrangência
ideológica e religiosa, tomou as medidas basilares para uma transformação
revolucionária nacional: fim do domínio colonial, nacionalização da banca e das
empresas públicas a favor do património nacional, combate ao monopólio privado
dos factores de produção, sobretudo latifúndios e riquezas naturais, que
deveriam ser organizados tendo em vista a ocupação da mão-de-obra existente, a
investigação científica e tecnológica, a produção dos alimentos e bens
indispensáveis à toda a população e à exportação.
Estavam lançadas as bases para que fosse criada uma economia
e organizada uma sociedade com autonomia e liberdade de consciência de
cidadania, bases para um país afirmar a sua independência perante as outras
nações e aperfeiçoar as condições de vida do seu povo. Os insidiosos
preconceitos anticomunistas e contra-revolucionários promovidos por elites
externas e internas, que perderiam a soberania sobre um povo que ainda não
conhecera a liberdade, despertaram antagonismos e competições políticas
prometendo lucros individuais na partilha dos produtos nacionais e privilégios
de classe para os seus apoiantes. Introduziram a cultura capitalista como meta
de crescimento económico e uma falsa linguagem caridosa contrapondo-se à luta
necessária para o desenvolvimento das forças produtivas com solidariedade e
respeito humanista da coesão popular.
Da ficção à realidade
A linha do golpe prevaleceu sobre a da consciência nacional
adequada à realidade de Portugal. Foi adoptado o modelo do que viria a ser a
União Europeia, uma ficção que cobriu o território de centros comerciais,
estádios de futebol e indústrias estrangeiras que vieram explorar a mão-de-obra
barata, de estradas por onde escoam os produtos importados e saem os emigrantes
em busca de empregos, de uma cultura moderna pré-fabricada para alienar as
populações sem acesso à verdadeira informação negada pelos meios de comunicação
submissos às elites mundiais. E, depois veio a crise do sistema com as dívidas
contraídas pela gestão perdulária de governantes irresponsáveis que traíram a
Revolução de Abril, venderam o património nacional ao desbarato, destruíram a
capacidade produtiva e enriqueceram os seus comparsas poderosos, apagando o
caminho para a independência de Portugal.
Com o velho discurso fariseu da humildade necessária ao povo
«devedor», da caridade com os que tudo perderam, confessam que a «austeridade
imposta em Portugal é demasiada porque os que a definiram não tinham
experiência» (declaração do Conselho Europeu divulgada pela RTP a 28/04/14). E
nada dizem da esperteza que tiveram de aplicar a austeridade aos trabalhadores,
idosos e crianças, enquanto os altos cargos recebem salários
milionários apesar da «falta de experiência». Assim agiu a troika e o FMI na
sua fatídica missão de destruir os povos.
Interessantes as palavras de Vasco Graça Moura: «A Europa
Comunitária deixou de ser, para terceiros, o Eldorado mítico que foi durante
muito tempo para terceiros. E alguns convencimentos mais ingénuos dos
autóctones quanto às excelências da fórmula encontrada começam também a
esboroar-se».(...) «a experiência tem mostrado que, na prática, as coisas não
são bem como se esperava e que esse ideal de uma Europa harmoniosamente
construída e convergente, quer no desenvolvimento económico sustentado, quer na
qualidade de vida dos seus cidadãos, está a sair tão caro quanto frustrado».
(...) O sistema não é de freios e contrapesos institucionais ao nível da
Europa. É antes uma teia obscura de interacções e condicionamentos políticos
por via de uma intergovernamentalização do todo ditada pelos mais fortes e
acolitada pela coreografia impune dos euroburocratas» (in «A identidade
cultural europeia», FFMS, Novembro/2013, pp.15-18).
O País perdeu uma oportunidade de se tornar independente,
mas o caminho da liberdade não foi fechado. Hoje compreende-se melhor a
realidade de uma História de heróis, conquistadores, colonizadores e de grandes
personalidades que se destacaram como ideólogos, filósofos, músicos,
literatos, cientistas, intelectuais e trabalhadores a nível
internacional. Os «donos do poder em Portugal» é que estão a mais, como esteve
Salazar (e Caetano), ditador aliado de Hitler por meio século.
Portugal, com as suas riquezas naturais, aí está com o seu
povo, capaz de retomar o caminho revolucionário sem se deixar enganar por
traidores ou inexperientes ambiciosos.
Postado por Zillah Branco às 02:38 Nenhum comentário:
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