Acentua-se a internacionalização de diversos conflitos armados na África, com o seu consequente agravamento. A tendência é antiga, mas intensificou-se nas últimas semanas, abrindo caminho a uma ainda maior ingerência das potências imperialistas, com os Estados Unidos e a França à cabeça.
Na Líbia, rica em petróleo, destruída enquanto Estado pela intervenção “humanitária” da Otan, em 2011, há um novo protagonista estrangeiro. O Egito enviou na semana passada caças-bombardeiros para atacar posições de radicais islâmicos líbios, junto da cidade de Derna, depois da divulgação de um vídeo mostrando a decapitação de 21 cristãos coptas que tinham sido raptados por um bando com ligações com o Estado Islâmico (EI). Milhares de egípcios que trabalhavam na Líbia estão, entretanto, a regressar ao seu país, quer pela fronteira entre os dois países, quer através da Tunísia.
No plano político, a Líbia divide-se entre um governo e um parlamento com sede em Trípoli, apoiados por milícias islâmicas, e outro governo e outro parlamento baseados em Tobruk, no Leste, reconhecidos pela “comunidade internacional”. Sob a égide das Nações Unidas, decorre em Marrocos uma tentativa de diálogo, até agora infrutífero, entre as duas facções.
Os observadores que acompanham de perto a caótica situação na Líbia consideram que o país se transformou numa gigantesca base “jihadista” que inquieta governos europeus (preocupados com as vagas de imigrantes clandestinos que tentam chegar às costas de Itália e, sobretudo, com a segurança do Mediterrâneo) e desestabiliza não só os vizinhos do Norte da África como uma parte da região Oeste-africana.
Sabe-se que islamitas líbios estabeleceram laços com os radicais do Mali, onde a França mantém um forte dispositivo militar, e com o Boko Haram, na Nigéria, ao qual fornecem armamento pesado.
A Nigéria tornou-se no mais recente exemplo na África da internacionalização de um conflito interno. Os ataques da seita islamita, ativa há anos no Nordeste do país, aumentaram nos últimos meses, perante a ineficácia do exército nigeriano, acusado de corrupção e de não querer combater. Mais: o Boko Haram estendeu as ações aos vizinhos Níger, Camarões e Chade, provocando uma resposta militar destes países, que procuram agora, mais o Benim, organizar uma força conjunta, patrocinada pela União Africana e pelas Nações Unidas.
A França, com fortes interesses e ligações na zona, no quadro da sua política neocolonial, não perdeu tempo. O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, efetuou há dias um périplo por Ndjamena, Niamey e Yaoundé, as capitais chadiana, nigerina e camaronesa, prometendo aos seus aliados apoio logístico e em informações militares. Assegurando assim que a guerra continua...
Noutras regiões do continente, o cenário da internacionalização dos conflitos repete-se.
No Corno da África, na Somália, um Estado-falhado após as intervenções estrangeiras ao longo da década de 90, registou-se mais um atentado sangrento, atribuído às milícias Al-Shebab. Um casal de bombistas fez-se explodir num luxuoso hotel de Mogadíscio, frequentado por altos funcionários governamentais, matando 25 pessoas e fazendo dezenas de feridos.
Os rebeldes islamitas somalis têm multiplicado ações de terror, sobretudo na capital, mas também no vizinho Quénia, que integra a missão militar da União Africana que opera na Somália. Estado privado de autoridade central desde 1991, quando caiu o regime autoritário do general Siad Barre, a Somália vive há décadas em permanente guerra civil.
No Sudão do Sul – o mais jovem país africano, que se tornou independente do Sudão em 2011, com o apoio dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais –, a guerra civil prossegue. Foi notícia nestes dias porque na cidade de Malakal, que acolhe milhares de deslocados, foram raptadas dezenas de crianças que provavelmente serão incorporadas à força num dos exércitos beligerantes, o governamental ou o dos rebeldes.
O conflito Sul-sudanês, que provocou a intervenção de uma missão das Nações Unidas e de tropas de países vizinhos, teve início em 2013 e opõe o presidente Salva Kiir ao seu antigo vice-presidente, Riek Machar.
A Unicef calcula que, no último ano, cerca de 12 mil crianças foram utilizadas como soldados por ambas as partes. A guerra fratricida causou já, além de milhares de mortos, um milhão e meio de deslocados. Há neste momento dois milhões e meio de sudaneses ameaçados por “severas carências alimentares”, que é como as agências internacionais chamam à fome.
Fonte: Jornal Avante
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