Em visita ao Ceará neste sábado (09/05), para participar da reunião ampliada do PCdoB-CE, que marca o final dos debates, no Estado, acerca da 10ª Conferência Nacional do Partido, a deputada federal Luciana Santos, futura presidenta da legenda, concedeu uma entrevista exclusiva ao caderno cearense do Portal Vermelho.
Luciana falou sobre o atual quadro político do país, as questões partidárias e ainda sobre a sua indicação para presidir o partido mais antigo do país. “Para mim é uma honra e um senso de responsabilidade muito grande, afinal a história do PCdoB se confunde com a história do povo brasileiro”, disse. Leia a seguir a íntegra da entrevista:
Ao longo dos últimos meses, o coletivo partidário vem discutindo nacionalmente o atual cenário político brasileiro. Como a senhora avalia esta iniciativa do PCdoB?
Nunca se viu um cenário tão complexo, de muitas adversidades e incertezas, seja por conta do aspecto político ou econômico. Este cenário de instabilidade toma conta do mundo desde a crise de 2008, considerada a terceira grande crise cíclica e sistêmica do capitalismo, que teve efeito avassalador na Europa, colocando os Estados Unidos com 54 bilhões de dólares de déficit na balança comercial e com baixo crescimento chinês. De maneira geral, a crise é impactante com a média de crescimento mundial em torno de 2%, o que revela que os impactos no Brasil também são frutos deste fenômeno.
O país tomou medidas anticíclicas, desde o Governo de Lula, e pode resistir à crise com muita força por conta dos ajustes estruturantes da economia. Num primeiro momento, houve um estímulo ainda maior ao aquecimento do mercado interno, com incentivo ao consumo, e medidas de grandes investimentos públicos do tesouro nacional para garantir o emprego e impulsionar a economia.
Hoje chegamos a uma situação em que o estado brasileiro não consegue mais ter fluxo de caixa, recurso no orçamento para fazer valer um conjunto de ações que são muito importantes para o povo, como o Bolsa Família, Fies, Prouni, do enfrentamento das desigualdades regionais. Isso tudo tem impacto objetivo e ganha dimensão política.
Vivemos uma crise política, com nuances de uma crise institucional porque tivemos uma das eleições mais polarizadas dos últimos tempos no Brasil em que, para além das divergências dos projetos antagônicos que estavam em debate, vimos uma campanha com momentos de ódio, disputa que revelou uma luta de classes em estágio muito acirrado e que contaminou o cenário político até hoje. Enfrentando um terceiro turno das eleições, com o embate dessas mesmas forças que se apresentam como alternativa política para a população.
Estamos num cenário de instabilidade que chega ao ponto em que nós temos que defender o estado democrático de direito, defender a constitucionalidade do mandado da presidenta Dilma, que passa a ser uma bandeira política objetiva em função das ameaças de golpismo que estamos vendo no Brasil, e a tentativa de alimentar a iniciativa política para poder resistir à crise garantindo uma agenda que retome o crescimento do país.
Esse é o esforço que estamos vivenciando agora no Congresso Nacional. Semana passada, tivemos o debate acerca do ajuste fiscal, que nós consideramos necessário em que pese discordarmos do caminho e do mérito do projeto, mas o assunto ganhou dimensão política, com polarização entre ou derrotar a presidenta Dilma ou derrotar a oposição. E fomos vitoriosos, a primeira vitoria que o Governo tem nesta legislatura.
Vamos fazer todo o esforço para que o PCdoB paute as nossas convicções que é a de mudar a política macroeconômica. Juros altos não resolvem o problema do crescimento nem garantem a retomada dos investimentos no setor produtivo.
Portanto nosso Partido está na luta para defender o mandato de Dilma; defender a Petrobras, alvo da oposição por conta do regime de partilha, do quanto ela é estruturante para impulsionar a retomada do crescimento econômico; e chamamos os movimentos sociais para manter acesas as suas pautas legítimas, como derrotar a terceirização no Senado, nas redes e nas ruas. Temos a capacidade de retomar a iniciativa política e fazer valer uma agenda positiva para o Brasil.
Além do cenário político, o PCdoB também tem se autoavaliado. Qual a importância deste processo dentro da 10ª Conferência do Partido?
No momento de Conferência sempre há a necessidade de a gente debater a construção partidária. Somos um Partido de perspectivas, temos um projeto estratégico que é a construção do Socialismo no Brasil. Nós não apontaremos para isso se não tivermos um Partido forte e influente. Temos o debatido a política partidária através da referência na política de fortalecimento dos quadros, de hierarquizar os territórios mais estratégicos do país e fazer valer uma agenda que se coadune com os desafios do Partido.
Sofremos revés na última campanha, quando reduzimos a quantidade de parlamentares no plano da Câmara dos Deputados, em que pese termos ampliado nossa participação nas Assembleias Legislativas. Também tivemos a eleição do primeiro governador comunista do país, Flávio Dino, no Maranhão, derrotando uma oligarquia que se mantinha há mais de 50 anos no poder, o que nos coloca numa situação de visibilidade importante. Também ampliamos a participação do PCdoB no governo federal. Saímos do Ministério do Esporte e ocupamos o Ministério da Ciência e Tecnologia, pasta bem mais estratégica na direção daquilo em que a gente acredita, que é um novo projeto nacional de desenvolvimento.
Os desafios são grandes e nós vamos, neste processo de Conferência e até depois, aprofundar melhor o nosso projeto de construção partidária.
Como a senhora recebeu a missão de liderar o PCdoB, berço de tantos e valorosos quadros?
Para mim é uma honra e um senso de responsabilidade muito grande, afinal, nos últimos 93 anos, a história do PCdoB se confunde com a história do povo brasileiro. O Partido surgiu no Brasil pós-revolução soviética, em 1922, de berço, composição social e perspectiva operária, de bagagem teórica assentada no Marxismo-Leninismo, e um Partido que, ao longo desse tempo todo, procurou participar dos principais desafios da história brasileira.
Participamos ativamente, na década de 1930, da resistência, nos movimentos mais progressistas que apontavam perspectivas que expressasse a inquietação do povo brasileiro para a agenda desenvolvimentista. Na década de 1940, a guerra contra o nazifascismo; na defesa da Petrobras como patrimônio importante do povo brasileiro; na Constituição de 1946, em que contribuímos efetivamente com deputados como João Amazonas, Maurício Grabois e Jorge Amado para escrever pontos importantes da Constituição como a prática da liberdade religiosa e questões dos interesses dos trabalhadores; na luta contra a ditadura militar, quando tivemos a maior perda de quadros valorosos e ainda as conquistas da CLT. Tudo isso teve o DNA e a participação decisiva dos comunistas, que continuam a ter papel decisivo no campo da esquerda neste novo ciclo iniciado pelo presidente Lula e apoiado pelo PCdoB.
É uma responsabilidade muito grande levar adiante um Partido que tem caráter, perspectiva, história. É uma honra e sei a dimensão dos desafios de levar o PCdoB a continuar cumprindo sua missão histórica que é superar o Capitalismo e lutar por uma sociedade mais justa e solidária.
Com experiência na Prefeitura de Olinda, deputada federal, jovem, nordestina, mulher, mãe. Como esses valores poderão contribuir com esse novo PCdoB?
O PCdoB, quando escolhe uma presidenta mulher, nordestina, jovem, negra, e todas essas condicionantes, revela o quanto é democrático, contemporâneo e inovador. Porque é exatamente num momento de tanta adversidade, intolerância e preconceito, que o Partido se apresenta repaginado, defendendo um novo Socialismo com a participação mais efetiva de lideranças com essas características que são próprias do PCdoB: jovem, preparado e com a força da mulher.
Diante deste processo da 10ª Conferência, qual a mensagem que a senhora deixa aos comunistas, em especial os cearenses?
O Ceará é minha segunda terra, pela afetividade que tenho com todos os quadros do Partido, identidade de muitas lutas que vivenciamos juntos, de maneira ousada, desde quando Inácio Arruda foi candidato a prefeito de Fortaleza, e eu disputava em Olinda. É um Partido promissor, que tem muito futuro.
Na legislatura passada teve dois mandatos de deputado federal, com João Ananias e Chico Lopes, que voltou ao Congresso, figura muito querida e prestigiada no cenário nacional. Temos o nosso primeiro senador depois de Luis Carlos Prestes, o cearense Inácio Arruda, liderança inconteste da cena política no Estado e gente como Lula Morais, grandes e valorosos quadros. Ressalto ainda nossa atuação nas diversas frentes institucionais, de massa, mulheres, juventude, de bairros, enfim. O PCdoB é vigoroso no Ceará.
Tenho visitado alguns Estados durante este processo de Conferência, mas é impossível ir a todos. Fiz questão de vir ao Ceará, pela importância e força que tem nacionalmente. Não poderia deixar de participar deste encontro e tenho certeza que os desafios aqui não são diferentes dos nacionais, que o enfrentamento às desigualdades também preocupam, mas é um estado que tem crescido a patamares maiores até que o crescimento nacional. Portanto o PCdoB tem um futuro promissor e tenho certeza de que os comunistas cearenses sempre darão o melhor da sua inteligência e da sua força para fazer valer uma agenda cada vez mais positiva para o Estado e para o país.
De Fortaleza,
Carolina Campos
(Foto: Roberto Fortuna)
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