sábado, 16 de fevereiro de 2013

Igreja precisa de papa 'mais pastor que professor', diz Boff


O  teólogo e ex-frade brasileiro Leonardo Boff, 74, conviveu com o papa Bento 16 e revela impressões suas sobre o papado do colega, que o puniu com um ano de silêncio obsequioso, a proibição de falar em público e de publicar suas ideias. Em 1992, Boff desligou-se da ordem franciscana. Para ele, Joseph Ratzinger foi um papa frustrado, que tentou reduzir a igreja a um "museu".



Durante seus estudos na Universidade de Munique, na Alemanha, nos anos 1960, Boff conviveu com Joseph Ratzinger, com quem conversava sobre teologia. Em 1985, foi surpreendido quando a Congregação para a Doutrina da Fé, no Vaticano, então presidida por Ratzinger, o puniu com um ano de silêncio obsequioso, a proibição de falar em público e de publicar suas ideias. Em 1992, desligou-se da ordem franciscana.

Expoente da Teologia da Libertação, linha que une princípios do catolicismo ao marxismo, hoje Leonardo Boff se diz aliviado com o anúncio da renúncia de Bento 16.

Folha de S. Paulo: O senhor conviveu com Joseph Ratzinger antes de ele se tornar papa. Como era a relação entre vocês?Leonardo Boff: Conheci Bento 16 nos meus anos de estudo na Alemanha, entre 1965 e 1970. Ouvi muitas conferências dele. Trabalhamos juntos na revista internacional "Concilium", entre 1975 e 1980. Enquanto os outros faziam sesta, eu e ele passeávamos e conversávamos sobre temas de teologia. Como pessoa, é finíssimo, tímido e extremamente inteligente.

Folha de S. Paulo: Ficou surpreso quando ele lhe impôs o silêncio obsequioso?
LB: Quando ele foi nomeado presidente da Congregação para a Doutrina da Fé, fiquei sumamente feliz. Quinze dias após, ele me disse: "Vejo que há várias pendências suas aqui". Aí eu me dei conta: ele já foi contaminado pelo bacilo romano que faz dos que lá trabalham moderados e conservadores. Fiquei, mais que surpreso, decepcionado.

Folha de S. Paulo: Como avalia o pontificado?LB: Bento 16 foi um eminente teólogo e um papa frustrado. Esse papa tentou reduzir a igreja a um museu de antiguidades.

Reintroduziu o latim na missa, escolheu vestimentas renascentistas, manteve hábitos palacianos para quem iria comungar. Oferecia primeiro o anel papal para ser beijado e depois dava a hóstia, coisa que já não se fazia.

Folha de S. Paulo: O senhor ficou aliviado quando ele anunciou a renúncia?LB: Desde o princípio, sentia muita pena dele, pois pelo que o conhecia, especialmente por sua timidez, imaginava o esforço que devia fazer para saudar o povo, abraçar pessoas, beijar crianças.

Embora tenha se mostrado autoritário, não era apegado ao cargo. Fiquei aliviado porque a igreja está sem liderança que suscite esperança e ânimo. Precisamos de um outro perfil de papa, mais pastor que professor.

Folha de S. Paulo: A igreja precisa se modernizar para evitar a perda de fiéis?LB: A igreja pode manter as suas convicções, como a questão do aborto e da não manipulação da vida. Mas deveria renunciar ao status de exclusividade, como se fosse a única portadora da verdade.

Fonte: Folha de S. Paulo

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