Por Eduardo Guimarães, no Blog
da Cidadania:
Nos primeiros dias de fevereiro, diminuiu
consideravelmente o contingente dos que não acreditam na possibilidade de a
direita midiática tentar derrubar a presidente Dilma Rousseff. Alguns fatos
recentes foram decisivos para esse despertar da consciência quanto ao ímpeto
golpista que se assanhou de forma tão explícita no período indicado.
Para
ter ideia de quanto cresceu o nível de radicalização dos derrotados na eleição
presidencial do ano passado, faça uma experiência: digite no Google, entre
aspas, as seguintes expressões: “impeachment de Dilma” e “impeachment de
Lula”.
Eis, abaixo, o resultado que obterá.
Esse comparativo se torna espantoso quando se
lembra que o governo Lula passou pelo dramático escândalo do mensalão, no qual
houve tentativa de envolvê-lo que se imaginava forte. Comparando com o que estão
fazendo com Dilma, porém, percebe-se que o ex-presidente acerta quando diz que
“nunca viu” fazerem com alguém o que estão fazendo com a sua afilhada
política.
Mas os motivos para essa maior consciência sobre a ameaça
golpista são bem mais concretos do que pode indicar essa eloquente consulta ao
“oráculo” da era digital. Vamos a eles.
1 – Vitória do peemedebista
Eduardo Cunha, inimigo declarado do governo, para a Presidência da Câmara. Essa
vitória ocorreu em franca hostilização ao Palácio do Planalto e reuniu uma
maioria massacrante daquela Casa – 375 deputados, número mais do que suficiente
para decretar o impedimento da presidente da República.
2 – Cogitação
insistente da tese pró impeachment na grande imprensa. No jornal Folha de São
Paulo, por exemplo, entre 31 de janeiro e 6 de fevereiro os termos Dilma e
impeachment apareceram todo dia, em 17 matérias. Antes disso, haviam aparecido
juntos pela última vez, naquele jornal, só em 29 de dezembro do ano
passado.
3 – Fernando Henrique Cardoso, José Serra e o ex-vice-governador
tucano de São Paulo Alberto Goldman previram e/ou pediram impeachment da
primeira mandatária da nação.
4 – O ex-presidente tucano chegou a
encomendar um “parecer jurídico” ao conhecido jurista antipetista Ives Gandra
Martins, que, por óbvio, deu parecer favorável, ainda que tal parecer tenha sido
condenado por um grande número de juristas, que chegaram a qualificá-lo como
mera peça política.
5 – A espetaculosa operação da Polícia Federal que
conduziu coercitivamente o tesoureiro do PT, João Vaccari, para prestar
depoimento, com direito a um vídeo malandro gravado, obviamente, pelos próprios
policiais e divulgado, maliciosamente, como se Vaccari tivesse oferecido
resistência, quando, na verdade, os policiais pularam o muro da casa dele ainda
de madrugada, antes de tocarem a campainha para comunicá-lo de que teria que
acompanhá-los.
6 – Expectativa de queda da popularidade de Dilma, que, se
ocorrer, sinalizará à oposição e à mídia que há “clima” para golpe, ainda que o
fato de não sair pesquisa sobre o tema desde o ano passado sugira que essa tão
almejada queda de popularidade pode não ter ocorrido por enquanto, apesar de a
presidente ter passado o mês de janeiro sob artilharia de todos os
lados.
De todos esses fatores, porém, o que parece ter indignado mais o
PT é o espetáculo montado pela Polícia Federal para conduzir Vaccari para depor.
Lembra, em muito, o golpe que policiais deram na candidatura Lula em 1989,
quando vestiram camisetas do PT nos sequestradores do empresário Abílio
Diniz.
O caso é especialmente grave porque, de todos os que foram presos
na tal Operação My Way, só Vaccari teve seu nome exposto na imprensa, apesar de
ter sido levado somente para depor, sem acusação formal da Justiça, enquanto que
aqueles que foram PRESOS tiveram seus nomes preservados. Tudo isso a 24 horas da
comemoração dos 35 anos do PT.
Foi no âmbito desse quadro de golpismo
explícito que o PT se reuniu em Belo Horizonte na última sexta-feira para
comemorar o aniversário do partido. No evento, a presidente Dilma, mais uma vez,
falou sobre todos os ataques que seu governo vem sofrendo. Além de defender a
Petrobrás, explicou medidas impopulares que adotou recentemente e pediu à
militância de seu partido que reaja.
Evidentemente que Dilma pode falar
quanto quiser que a mídia só irá reproduzir o que lhe interessa. O mesmo se dá
com Lula. Todas as críticas que ambos fizeram à manipulação de informações
contra o governo e contra o partido do governo obviamente que, se saírem, será
só na imprensa escrita, que ninguém lê.
Alguns dirão que Dilma poderia
usar rede nacional de rádio e tevê para se defender, mas o fato é que os
pronunciamentos dessa natureza são reservados para o governante comunicar fatos
de interesse da população, não para fazer política, mesmo que seja para se
defender. Eventual uso desse meio, neste momento, daria margem para Eduardo
Cunha fazer uma das suas, agora que tem poder para tanto…
Porém, a fala
mais contundente do evento supracitado foi a de Lula. Sobretudo quando
improvisou antes de proferir discurso escrito, que justificou por não querer
falar “tudo o que pensa” sobre o que estão fazendo com o seu
partido.
Confira, abaixo, a improvisação de Lula antes da leitura de seu
discurso.
“A gente fica mais indignado do que outros dias e a gente
então tem que ter muito cuidado para não repassar aqui, nessa festa de 35 anos,
a indignação que eu fiquei ontem, porque seria muito mais simples a polícia
federal ter convidado o nosso tesoureiro para se apresentar do que ir buscá-lo
em casa.
Seria muito mais simples dizer que eles estão repetindo o mesmo
ritual que eu vejo acontecer nesse Brasil desde 2005, quando começaram as
denúncias que eles chamaram de “mensalão”. Toda quinta-feira (…) começa a sair
boato; na sexta-feira sai a denúncia, é publicada pelas revistas, sai na
televisão; no sábado, continua saindo na televisão; no domingo, massacre pela
imprensa e, na segunda-feira, começa um outro assunto para, na semana, começar
tudo outra vez.
É um ritual que está se repetindo. Na campanha, a
companheira Dilma foi vítima disso como poucas vezes eu vi alguém ser. E a
utilização, pela mídia, não é o critério da informação. Porque nós achamos que
tudo que acontece no país tem que ser informado, mas o critério adotado pela
mídia brasileira é o da criminalização do Partido dos Trabalhadores desde que
nós chegamos à Presidência.
Eles trabalham com a convicção de que é
preciso criminalizar o nosso partido. Não importa que seja verdade ou não
verdade, o que interessa é a construção da versão para se construir uma
narrativa.
Então, eu pensei: se eu for falar tudo o que eu penso vai ser
muito ruim porque vão dizer que eu estou aqui falando com o fígado, e eu não
quero prejudicar o meu fígado com 69 anos de idade (…)”
A fala de
Lula tem um significado que vai além das palavras proferidas. Não é o que foi
dito, é quem disse. E quem disse foi alguém que tem forte influência, e até
ascendência, não apenas sobre o PT, mas sobre os movimentos sociais e sindicais
que vêm torcendo o nariz para Dilma, sobretudo após a escolha de ministros que
desagradaram esses setores.
Por mais que cogitem que Lula não tenha hoje
a força política que tinha ontem, Lula ainda é Lula. Sob seu comando – se é que
cabe o termo – CUT, MST e até a UNE, entre muitos outros movimentos sociais,
ficarão ao lado da legalidade, ou seja, do mandato constitucional e legítimo
obtido por Dilma Rousseff em 26 de outubro do ano passado.
Esse fato novo
– Lula estava calado, como Dilma – insere um elemento vital na equação golpista.
A menos que a próxima pesquisa sobre a popularidade da presidente revele uma
queda muito acentuada, o fator Lula servirá como elemento dissuasório. E mesmo
que a queda de popularidade seja pronunciada, com Lula no jogo a direita sabe
que haverá reação que poderia não haver sem que ele se dispusesse a
liderá-la.
Por fim, a liderança de Lula terá forte efeito sobre a
militância independente do PT, que vinha demonstrando irritação com a falta de
reação do partido, da presidente e até do próprio ex-presidente. Sob o comando
deste, veremos até simpatizantes do PT indo à rua defender a legalidade, se
necessário.
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