A ofensiva patrocinada pelas forças políticas conservadoras ameaça o conjunto das conquistas econômicas, sociais e políticas que foram obtidas ao longo dos últimos anos. Tendo sido derrotadas nas eleições de outubro de 2014, as elites planejam a derrubada do governo da Presidenta Dilma por meio de uma estratégia claramente golpista.
Contando com o apoio descarado de setores retrógrados do Judiciário, do Ministério Público e da maioria das grandes empresas do conglomerado de comunicações, a oposição direitista e irresponsável se aproveita da fragilidade da equipe governamental para tentar promover a sua substituição ao arrepio da lei e das regras institucionais.
Esse tem sido o enredo articulado e implementado a cada dia por todos os interessados em arrancar pela força aquilo que foi legitimamente conquistado pelas urnas: o mandato presidencial. Vazamentos seletivos, uso indiscriminado do mecanismo de delação premiada, condução coercitiva para depoimentos, escutas e gravações ilegais, vazamentos meticulosamente selecionados de informação, foram apenas alguns exemplos das inúmeras artimanhas utilizadas pelos operadores da maracutaia.
Golpe midiático-jurídico
No entanto, o mais importante foi a entrada da imprensa nessa estratégia de criação e legitimação do “golpe-do-fato-consumado”. As redes de TV, os portais de notícia na internet, os jornais impressos e as revistas semanais passam a constituir um verdadeiro quartel general tramando a continuidade do sangramento até a derrubada final do governo. Com seus recursos poderosos e sua audiência que não pode ser subestimada, contribuem para criar uma versão completamente deturpada dos fatos políticos e de sua real repercussão no interior da sociedade. Assim como as investigações e os vazamentos eram seletivos, no caso apenas as manifestações contrárias ao governo ocupam toda a cena comunicativa.
A expressão mais evidente de tal comportamento tendencioso e pró golpe talvez seja a cobertura que algumas redes de TV fazem das jornadas pelo impeachment. O que se viu nesses casos foi uma cobertura ininterrupta de 24hs, com equipes de reportagem em todas localidades e um viés descarado na coleta das opiniões e análises. A impressão que o espectador fica é de que o país todo está focado naqueles eventos e que existiria uma espécie de unanimidade a favor do impedimento de Dilma. O mais impressionante é que o uso de uma concessão de serviço público seja apropriado para mobilizar as pessoas a participarem ativamente do golpe.
O mesmo desvio ocorre na cobertura dos fatos na dinâmica parlamentar. Preocupados em obter a vitória da tese do impedimento nas 2 casas do Congresso Nacional a qualquer custo, os golpistas pouco se importam com a existência ou não de qualquer indício que comprometa a Presidenta quanto a eventual crime de responsabilidade praticado em seu mandato. Os meios de comunicação repercutem as denúncias vazias como se verdade fossem e conclamam ao impeachment.
Para resistir é preciso mudar
O agravamento da situação política reforça a necessidade de se buscar o apoio amplo da população para evitar a consumação do afastamento de Dilma. Não se trata de conclamarmos apenas aqueles que concordam com a orientação política do governo. O que está em disputa em nosso País é a defesa do Estado Democrático de Direito contra a tentativa de manipulação oportunista, ao conhecido estilo de eventos passados que tristemente marcaram a história política latino-americana.
No entanto, para que a resistência ao golpe encontre amplo respaldo popular é necessário também superar o momento atual de baixa popularidade do governo. Para tanto, torne-se essencial que sejam anunciadas medidas que ofereçam alguma perspectiva de superação da crise econômica e que apontem para a retomada do projeto focado no desenvolvimento.
A preocupação em atender exclusivamente aos interesses do financismo tem apresentado agora a sua fatura política mais dolorosa. Passados quase 15 meses do início do segundo mandato, os resultados têm sido, literalmente, catastróficos. Ao se manter fiel aos aspectos essenciais da proposta do tripé da política econômica, o governo não foi capaz de se libertar da armadilha do superávit primário.
Com isso, permaneceu inalterada a drenagem sistemática de recursos orçamentários para o pagamento de juros e serviços da dívida pública. Ao longo dos últimos 12 meses, por exemplo, foi destinado ao sistema financeiro a esse título o volume de R$ 540 bilhões, algo que representa mais de 9% do PIB. Uma loucura!
Romper com o asutericídio
Porém, o mais dramático é que o discurso oficial continua repetindo “ad nauseam” os argumentos apresentados pelo ex-ministro Joaquim Levy. Trata-se da insistência em focar unicamente na busca do ajuste fiscal conservador a qualquer preço. Assim, a orientação é promover cortes e mais cortes nas despesas da área social e dos investimentos públicos. E dá-lhe redução de gastos em setores essenciais, como educação, saúde e similares. E dá-lhe contingenciamento de rubricas orçamentárias em programas estratégicos, como habitação, saneamento e outros. E dá-lhe anúncio atabalhoado de medidas impopulares e injustas, com a Reforma da Previdência Social.
A insistência cega dos responsáveis pela economia em trilhar o caminho do austericídio nos levou à redução do ritmo de atividades, com as consequências de falência, desemprego e piora generalizada nas condições de vida da maioria da população. Esse quadro se tornou agravado pela diminuição das receitas tributárias, pois elas estão intimamente vinculadas aos níveis de produção, troca e consumo. A concessão de desonerações de forma aloprada ao capital e sem exigência de contra partida compromete agora cada vez mais a capacidade de arrecadação do setor público.
Pelo lado da política monetária, a orientação tampouco trouxe algum alento. Pelo contrário, manteve-se firme e forte a orientação de arrocho por meio da taxa oficial de juros, tal como vem definindo há anos o COPOM. Além de aumentar de forma expressiva a despesa pública de natureza financeira, os juros elevados significam um esforço de toda a sociedade, que termina por drenar seus recursos, já escassos em época de crise, para o financismo. Não é por acaso que o único setor que tem apresentado lucros bilionários em sequência ao longo dos anos tem sido aquele representado pelo mundo das finanças. É preciso dizer alto e em bom tom: qualquer início de projeto progressista passa pela redução imediata da SELIC. E também pela determinação aos grandes bancos públicos que reduzam seus spreads nas operações de crédito junto a empresas e famílias.
Para ser eficiente e convidativo, o chamado antigolpista deve oferecer um alento à grande maioria da população, que já começa a sofrer os efeitos da crise social e econômica. Isso significa reafirmar que não serão alterados os alicerces básicos da política de bem estar social e que as regras do salário mínimo não serão mudadas. Deve-se oferecer a segurança política de que o governo não embarca na aventura neoliberal de que o “modelo previsto na Constituição não cabe no Orçamento”. Porém, é necessário ir mais além, dada a gravidade e a emergência da situação.
Uma série de entidades e instituições têm apresentado suas sugestões para que seja viabilizado o tão esperado salto à frente. A retomada do crescimento implica abandonar a lógica do superávit primário e afirmar que a saída da crise passa por recuperar o protagonismo do Estado, e não o seu esmagamento como apregoam os arautos do liberalismo. Os investimentos públicos devem ser a bússola orientadora para que o setor privado também acompanhe a recuperação das atividades de uma forma geral.
O momento é difícil e o governo está realmente encurralado. Porém, não existe saída que não seja a mobilização popular. E para isso é necessário finalmente transformar em políticas públicas o discurso da vitória eleitoral em outubro de 2014.
* Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
Esse tem sido o enredo articulado e implementado a cada dia por todos os interessados em arrancar pela força aquilo que foi legitimamente conquistado pelas urnas: o mandato presidencial. Vazamentos seletivos, uso indiscriminado do mecanismo de delação premiada, condução coercitiva para depoimentos, escutas e gravações ilegais, vazamentos meticulosamente selecionados de informação, foram apenas alguns exemplos das inúmeras artimanhas utilizadas pelos operadores da maracutaia.
Golpe midiático-jurídico
No entanto, o mais importante foi a entrada da imprensa nessa estratégia de criação e legitimação do “golpe-do-fato-consumado”. As redes de TV, os portais de notícia na internet, os jornais impressos e as revistas semanais passam a constituir um verdadeiro quartel general tramando a continuidade do sangramento até a derrubada final do governo. Com seus recursos poderosos e sua audiência que não pode ser subestimada, contribuem para criar uma versão completamente deturpada dos fatos políticos e de sua real repercussão no interior da sociedade. Assim como as investigações e os vazamentos eram seletivos, no caso apenas as manifestações contrárias ao governo ocupam toda a cena comunicativa.
A expressão mais evidente de tal comportamento tendencioso e pró golpe talvez seja a cobertura que algumas redes de TV fazem das jornadas pelo impeachment. O que se viu nesses casos foi uma cobertura ininterrupta de 24hs, com equipes de reportagem em todas localidades e um viés descarado na coleta das opiniões e análises. A impressão que o espectador fica é de que o país todo está focado naqueles eventos e que existiria uma espécie de unanimidade a favor do impedimento de Dilma. O mais impressionante é que o uso de uma concessão de serviço público seja apropriado para mobilizar as pessoas a participarem ativamente do golpe.
O mesmo desvio ocorre na cobertura dos fatos na dinâmica parlamentar. Preocupados em obter a vitória da tese do impedimento nas 2 casas do Congresso Nacional a qualquer custo, os golpistas pouco se importam com a existência ou não de qualquer indício que comprometa a Presidenta quanto a eventual crime de responsabilidade praticado em seu mandato. Os meios de comunicação repercutem as denúncias vazias como se verdade fossem e conclamam ao impeachment.
Para resistir é preciso mudar
O agravamento da situação política reforça a necessidade de se buscar o apoio amplo da população para evitar a consumação do afastamento de Dilma. Não se trata de conclamarmos apenas aqueles que concordam com a orientação política do governo. O que está em disputa em nosso País é a defesa do Estado Democrático de Direito contra a tentativa de manipulação oportunista, ao conhecido estilo de eventos passados que tristemente marcaram a história política latino-americana.
No entanto, para que a resistência ao golpe encontre amplo respaldo popular é necessário também superar o momento atual de baixa popularidade do governo. Para tanto, torne-se essencial que sejam anunciadas medidas que ofereçam alguma perspectiva de superação da crise econômica e que apontem para a retomada do projeto focado no desenvolvimento.
A preocupação em atender exclusivamente aos interesses do financismo tem apresentado agora a sua fatura política mais dolorosa. Passados quase 15 meses do início do segundo mandato, os resultados têm sido, literalmente, catastróficos. Ao se manter fiel aos aspectos essenciais da proposta do tripé da política econômica, o governo não foi capaz de se libertar da armadilha do superávit primário.
Com isso, permaneceu inalterada a drenagem sistemática de recursos orçamentários para o pagamento de juros e serviços da dívida pública. Ao longo dos últimos 12 meses, por exemplo, foi destinado ao sistema financeiro a esse título o volume de R$ 540 bilhões, algo que representa mais de 9% do PIB. Uma loucura!
Romper com o asutericídio
Porém, o mais dramático é que o discurso oficial continua repetindo “ad nauseam” os argumentos apresentados pelo ex-ministro Joaquim Levy. Trata-se da insistência em focar unicamente na busca do ajuste fiscal conservador a qualquer preço. Assim, a orientação é promover cortes e mais cortes nas despesas da área social e dos investimentos públicos. E dá-lhe redução de gastos em setores essenciais, como educação, saúde e similares. E dá-lhe contingenciamento de rubricas orçamentárias em programas estratégicos, como habitação, saneamento e outros. E dá-lhe anúncio atabalhoado de medidas impopulares e injustas, com a Reforma da Previdência Social.
A insistência cega dos responsáveis pela economia em trilhar o caminho do austericídio nos levou à redução do ritmo de atividades, com as consequências de falência, desemprego e piora generalizada nas condições de vida da maioria da população. Esse quadro se tornou agravado pela diminuição das receitas tributárias, pois elas estão intimamente vinculadas aos níveis de produção, troca e consumo. A concessão de desonerações de forma aloprada ao capital e sem exigência de contra partida compromete agora cada vez mais a capacidade de arrecadação do setor público.
Pelo lado da política monetária, a orientação tampouco trouxe algum alento. Pelo contrário, manteve-se firme e forte a orientação de arrocho por meio da taxa oficial de juros, tal como vem definindo há anos o COPOM. Além de aumentar de forma expressiva a despesa pública de natureza financeira, os juros elevados significam um esforço de toda a sociedade, que termina por drenar seus recursos, já escassos em época de crise, para o financismo. Não é por acaso que o único setor que tem apresentado lucros bilionários em sequência ao longo dos anos tem sido aquele representado pelo mundo das finanças. É preciso dizer alto e em bom tom: qualquer início de projeto progressista passa pela redução imediata da SELIC. E também pela determinação aos grandes bancos públicos que reduzam seus spreads nas operações de crédito junto a empresas e famílias.
Para ser eficiente e convidativo, o chamado antigolpista deve oferecer um alento à grande maioria da população, que já começa a sofrer os efeitos da crise social e econômica. Isso significa reafirmar que não serão alterados os alicerces básicos da política de bem estar social e que as regras do salário mínimo não serão mudadas. Deve-se oferecer a segurança política de que o governo não embarca na aventura neoliberal de que o “modelo previsto na Constituição não cabe no Orçamento”. Porém, é necessário ir mais além, dada a gravidade e a emergência da situação.
Uma série de entidades e instituições têm apresentado suas sugestões para que seja viabilizado o tão esperado salto à frente. A retomada do crescimento implica abandonar a lógica do superávit primário e afirmar que a saída da crise passa por recuperar o protagonismo do Estado, e não o seu esmagamento como apregoam os arautos do liberalismo. Os investimentos públicos devem ser a bússola orientadora para que o setor privado também acompanhe a recuperação das atividades de uma forma geral.
O momento é difícil e o governo está realmente encurralado. Porém, não existe saída que não seja a mobilização popular. E para isso é necessário finalmente transformar em políticas públicas o discurso da vitória eleitoral em outubro de 2014.
* Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário