As mídias sociais mais uma vez demonstram sua força ao divulgar o crime de racismo que vitimou o jogador Daniel Alves do Barcelona durante a partida contra o Villarreal. Ao perceber que um torcedor atirou uma banana, de modo perspicaz, o atleta descascou e comeu a fruta, em seguida cobrou o escanteio e deu sequência ao jogo.
Por André Luiz da Silva*
O colega de clube e de seleção brasileira, Neymar foi o primeiro a hipotecar solidariedade e postou foto ao lado do filho empunhando uma banana. Posteriormente, foi veiculado que a atitude foi pensada e produzida pela agência publicitária do ídolo catalão.
A campanha incentiva as vítimas de racismo e discriminação a levar os atos na brincadeira como forma de cansar o agressor ou demonstrar que sua atitude não causou o impacto esperado. Dizem que até um famoso apresentador de televisão estaria vendendo camisetas com bananas e frases de efeito estampadas.
Creio que a banalização ou a “bananalização” da discriminação racial se trata de um equívoco. A inusitada atitude de Dani Alves foi fantástica para aquele momento e precisa ser contextualizada e potencializada. A melhor forma de honrá-la é sensibilizar todos os que se solidarizaram e postaram fotos comendo bananas, de que para os milhões de negros e negras que diariamente são humilhados não é possível esquecer a dor e os danos que sofreram. Por mais que as feridas causadas pela chibata não estejam expostas, elas continuam existindo.
Também é fundamental o entendimento da atitude do agressor. O racismo é uma criação social que defende a existência de hierarquia entre os seres humanos e nos divide em superiores e inferiores. Ele foi usado como justificativa para humanos escravizarem, violentarem, subjugarem e matarem humanos e possui várias nuances. Uma das principais é a permanente humilhação, e se tratando de humilhar, a primeira atitude do opressor é a desumanização. Chamar alguém de rato, cachorro, piranha, galinha ou macaco é um artifício para justificar um tratamento agressivo e de modo subliminar impor a ideia de que o mesmo não merece a consideração e o respeito humano.
Nossa história está repleta de exemplos que comprovam que o racismo é uma forma de dominação. Cumpre lembrar que Brasil, último país a terminar com a escravidão, continua sendo um grande foco do pensamento racista ocidental imposto a partir da colonização e que servia de argumento para as atrocidades cometidas contra indígenas e africanos.
Enquanto não forem desenvolvidas políticas públicas que possibilitem alcançarmos um novo patamar social que efetivamente garanta a igualdade, não poderemos simplesmente deixar para lá. Temos que denunciar, protestar, cobrar ações civis, indenizatórias e criminais contra os que insistem em praticar atos de segregação, racismo e discriminação. Não vamos nos esquecer do árbitro Márcio Chagas e dos atletas Tinga e Arouca.
Tão pouco nos esqueceremos da onda de violência que dizima considerável parte da juventude negra nas periferias de todo país. Vamos sempre nos lembrar do pedreiro Amarildo, assassinado em uma UPP e de Cláudia Ferreira, baleada e arrastada por uma viatura policial pelas ruas do Rio de Janeiro.
A frase “somos todos macacos” quando utilizada como ferramenta contra o racismo é aceitável, mas quando empregada como forma de relativizar um crime histórico, perde totalmente o sentido e produz efeito contrário ao inicialmente proposto.
Talvez se todos cumprissem a Lei Federal 10.639/2003 que inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira" a nossa tão cantada, porém ilusória, democracia racial seria realidade.
Enquanto isso temos de protestar, sim, contra o racismo. Com a mesma intensidade e força que soltamos o grito de gol, devemos gritar que nós não somos macacos!
* André Luiz da Silva é vereador pelo PCdoB em Ribeirão Preto.
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