Povo na rua, a chave
Luiz Manfredini *Há tempos não se ouvia falar tanto em movimento social pelas forças democráticas e progressistas que apoiam a legitimidade do mandato da presidente Dilma Rousseff e o projeto nacional que, a despeito de dificuldades conjunturais, ela incorpora. O movimento social foi chamado para decidir a vitória eleitoral de outubro e, em seguida, para fazer frente à avalanche da conspiração da direita. E vem sendo constantemente instado a garantir nas ruas as conquistas até hoje obtidas, a partir de 2003.
Essas conclamações eloquentes demonstram a dimensão política do movimento social. Não é por menos que a própria direita, além de suas articulações nos bastidores, também busque arregimentar forças sociais para conferir concretude e consequência às suas conspiratas de hábito. Nada a estranhar, pois povo na rua é elemento chave das transformações, sejam elas de avanço ou retrocesso.
Uma reflexão impostergável para as forças de esquerda é até que ponto, uma vez alçadas ao governo federal a partir de 2003 (e também a outros níveis de governo e suas ramificações), passaram, em maior ou menor grau, a se distanciar dos movimentos sociais, confiando mais nos gabinetes e nas articulações congressuais. Até que ponto superestimaram a atuação institucional, sem dúvida importante, muitas vezes decisiva, mas não a única. Até que ponto, em nome da governabilidade, tais forças – direta ou indiretamente – contiveram as lutas populares, cedendo aos segmentos conservadores das alianças estabelecidas.
Diante da crise política da atualidade brasileira, tal reflexão é irrecusável. Tenho para mim que o processo de acumulação de forças, rumo às transformações progressistas de que o Brasil necessita, inclui uma justa articulação entre a atuação institucional, nas lutas sociais e de ideias. Eis o tripé do avanço, onde os movimentos populares são o ponto fulcral. Ou seja: é para eles, para seu fortalecimento político e orgânico, para o robustecimento de sua consciência transformadora que devem se voltar tanto a luta institucional, quanto a das ideias, embora esses dois elementos do tripé possam, em determinados momentos do processo político, assumir principalidade.
As conclamações do movimento social tem resultado apenas relativo se as forças de esquerda estiverem distantes da vida, da organização e da luta dos trabalhadores, dos jovens, das mulheres, da intelectualidade progressista. Porque, como afirma o historiador Augusto Buonicore, “em última instância é nas ruas e nas praças que os destinos das revoluções geralmente são decididos”.
Obviamente, para que o movimento social se mobilize contra o golpismo e o retrocesso anunciado pela direita, apoiando o mandato da presidente, é preciso que o governo faça a sua parte, ou seja, abra um diálogo franco e consistente com as representações sociais, interaja mais abertamente com a sociedade, comunique-se com ela e cumpra a promessa feita pela presidente em seu discurso de posse, quando defendeu o compromisso de “nenhum direito a menos, nenhum passo atrás”. No entanto, como afirma, em artigo, Breno Altman, o governo “adotou políticas e discursos desorganizadores do campo progressista que a reelegeu”. Aí as coisas tornam-se mais difíceis. Mas esta é conversa para outra hora.
* Jornalista a escritor paranaense, autor, entre outros livros, dos romances "As moças de Minas", "Memória e Neblina" e "Retrato no entardecer de agosto".
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