Por Altamiro Borges
Muita gente séria tem afirmado que Eduardo Cunha, o famoso
'achacador' que hoje preside a Câmara Federal, está “morto politicamente”. Há
quem garanta que as denúncias feitas pelo empresário Júlio Camargo, de que o
lobista recebeu US$ 5 milhões em propina, pode até resultar no seu impeachment e
na sua prisão. Até setores da mídia, que sempre estimularam o oposicionismo do
“peemedebista rebelde”, já preveem o seu total isolamento. A revista Época, da
famiglia Marinho, registrou uma cena curiosa que confirmaria a difícil situação
do seu aliado temporário no ódio ao governo Dilma. Vale conferir a notinha do
jornalista Ricardo Della Coletta:
Ninguém esperava
muitos parlamentares circulando pela Câmara Federal numa sexta-feira que
inaugura o recesso parlamentar, mas chamou a atenção de quem acompanhou a
coletiva de imprensa, na qual o presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ) anunciou que
estava rompido com o governo, a presença de apenas quatro deputados a seu lado:
Hildo Rocha (PMDB-MA), Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC), Édio Lopes (PMDB-RR)
e André Moura (PSC-SE). Destes, apenas Moura é líder de bancada. Graúdos da
Câmara lá não apareceram.
A cena revela, de fato, a solidão
momentânea do 'imperador'. Ele também foi rifado pelo seu partido, o PMDB, que
soltou nota oficial afirmando que o tal rompimento é “posição pessoal”; levou
uma canelada do juiz Sérgio Moro, o seu aliado na midiática Operação Lava-Jato;
e não recebeu nem a solidariedade dos seus amigos da oposição demotucana. Mesmo
assim, é bom não esquecer que o Congresso Nacional, o primeiro ironicamente
eleito com base na “lei da ficha limpa”, é o mais conservador desde o fim da
ditadura militar – quando só existiam os partidos do “sim” e do “sim senhor”. O
que impera no parlamento é a chamada “bancada do BBB”, com representantes da
Bala, da Bíblia e dos Bois. Eduardo Cunha é o rei do gado nesta composição
reacionária.
A bancada do BBB e a costa quente
A própria
Folha, que recentemente se distanciou do deputado carioca temendo seu
fundamentalismo religioso e seu radicalismo aventureiro, fez um importante
alerta neste sábado (18): “A entrevista do presidente da Câmara [em que ele
declarou guerra a Dilma] deflagrou uma insurgência silenciosa de aliados que se
dispõem a abandoná-lo. É cedo, porém, para declarar seu isolamento. Com o apoio
dos empresários, ele ajudou a financiar a campanha de mais de cem deputados”.
Mais de cem devedores do lobista! Além da bancada do BBB, Eduardo Cunha tem
“costa quente” e conta com fortes apoios:
- Dos empresários que
financiaram sua campanha para receber em troca o apoio aos seus projetos de
interesse. As multinacionais das telecomunicações, as agressivas mineradoras, as
empresas do ramo farmacêutico, entre outras, contam com o lobista para impor
suas pautas. Mesmo os setores patronais que não doaram dinheiro para o caixa de
Eduardo Cunha sabem que contam com os seus préstimos. Vide a votação acelerada
da terceirização, que precariza o trabalho e serve unicamente às empresas.
Eduardo Cunha é um político orgânico do capital.
- Dos setores da mídia,
como a Rede Globo e a revista “Veja”, que seguem blindando o parlamentar com o
objetivo exclusivo de fustigar o governo Dilma. Em certo sentido, Eduardo Cunha
é refém dos impérios midiáticos, que conhecem toda sua trajetória - a sua folha
corrida -, mas evitam fazer alarde para não prejudicar o seu oposicionismo. O
presidente da Câmara Federal é pautado pelos barões da mídia e não pode "mijar
fora do penico". Neste momento de dificuldades, ele deverá radicalizar ainda
mais sua postura - o que serve perfeitamente aos interesses da mídia monopolista
e oposicionista.
- Dos setores mais reacionários da sociedade - incluindo
os "milicos de pijama" saudosos da ditadura, as seitas fundamentalistas que
destilam ódio e preconceito contra as chamadas "minorias" e os grupos que
organizaram as recentes marchas golpistas. Estes setores inclusive já
manifestaram solidariedade a Eduardo Cunha contra as denúncias de corrupção. Os
fascistas mirins dos grupelhos "Revoltados Online" e Movimento Brasil Livre
(MBL), entre outros, estiveram recentemente com o presidente da Câmara e
depositam todas as fichas na sua disposição de abrir o processo de impeachment
de Dilma. "Todos temos simpatia pelas ações do Cunha e pela saída da
presidente", afirmou na ocasião Danilo Amaral, o fascistóide que agrediu o
ex-ministro Alexandre Padilha e lidera a seita "Acorda Brasil".
Um
lobista sedutor e agressivo
Além destes apoios, Eduardo Cunha é um
político habilidoso. Ele sabe mesclar sedução e violência e conhece, como
poucos, o regimento interno do Legislativo. Em maio, por exemplo, ele aprovou -
"na surdina", segundo a Folha - norma que garante isenção tributária às igrejas.
"Com o aval de Eduardo Cunha, evangélico, o artigo foi incorporado na medida
provisória do ajuste fiscal... O benefício pode garantir a anulação de autuações
fiscais que extrapolam R$ 300 milhões", descreveu o jornal paulista.
Generosidades como estas reforçam as promiscuas relações da bancada do BBB e
ainda seduzem os parlamentares do "baixo clero", que adoram sugar os cofres
públicos com a sua visão patrimonialista.
Já diante dos seus desafetos, o
lobista é implacável. Logo após assumir a presidência da Câmara, ele isolou seus
críticos nas 36 comissões especiais da Casa. Com esse controle absoluto, Eduardo
Cunha impôs o seu ritmo e garantiu a tramitação de vários projetos do seu
interesse - e dos seus doadores de campanha. Mesmo quando foi derrotado em
plenário - como no fim do financiamento privado e na maioridade penal -, ele
simplesmente desconheceu o resultado e impôs novas votações. Agressivo e
vingativo, ele não perdoa ninguém. Na semana passada, a Procuradoria-Geral da
República recebeu denúncias de que o lobista ameaçou seus delatores na midiática
Operação Lava-Jato. A PGR chegou a sugerir a prisão preventiva do presidente da
Câmara para garantir a continuidade das investigações.
Estes e outros
fatos mostram que não se deve subestimar Eduardo Cunha. Ele ainda não está
"morto politicamente" e ainda pode causar muitos estragos à frágil democracia
brasileira.
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