quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Prefeito faz greve de fome na Espanha contra austeridade


Texto do Dear Spiegel desta sexta-feira (17) conta a história de Angel Vadillo, prefeito de Albuquerque, com 5.500 habitantes, no Oeste da Espanha. Há 20 anos a cidade tem investido na energia solar, além de projetos para cinco novas usinas, antes dos cortes de subsídios. Acampado em frente ao ministéiro da Indústria, em greve de fome há dois meses, Vadillo denuncia a crise econômica e a falta de vontade política em seu país em preservar o meio ambiente.



Angel Vadillo faz greve de fome para chamar a atenção do governo espanhól/foto: energias-renovables.com


Já se passaram quatro meses desde que Angel Vadillo começou a acampar em uma van velha na frente do Ministério de Indústria da Espanha, no dia 10 de abril. Nos últimos dois meses, ele não comeu. A van dele é simples, decorada apenas com uma foto de sua neta de um ano e meio. Além disso, conta com um colchonete, uma estante de livros, um laptop e um telefone celular, ambos carregados por energia solar.

De fato, foi exatamente a energia solar que motivou o protesto incomum de Vadillo em primeiro lugar. Em janeiro, o Ministro da Indústria da Espanha, José Manuel Soria, cortou todos os subsídios para novos projetos relativos à energia renovável. Vadillo é prefeito de Albuquerque, um município com 5.500 habitantes em Extremadura, no Oeste da Espanha. Nas duas últimas décadas, Albuquerque apostou seu futuro na energia solar, e tinha projetos para cinco novas usinas com capacidade de 250 megawatts antes dos cortes de subsídios. Agora, esses projetos foram engavetados: “Isso significa que vamos perder cerca de 850 empregos”, disse Vadillo. Estima-se que a medida custará um total de 10.000 empregos em todo o país.

Vadillo espera forçar o ministro a pelo menos sentar-se à mesa de negociação. Sua missão começou andando os 600 quilômetros de seu município até Madri. Quando o ministro da indústria recusou-se a recebê-lo, ele decidiu acampar na frente do ministério. Quando isso tampouco surtiu o resultado esperado, ele parou de comer. Isso foi no dia 11 de junho.

A esta altura, o prefeito está visivelmente mais magro. Mas ele não perdeu sua força de vontade. “Bebo oito litros de água com mel todos os dias”, diz ele. “Isso me mantém alerta”. Uma ambulância faz uma visita diária para checar sua saúde. “A situação está ficando crítica”, diz um enfermeiro, mas Vadillo pretende prosseguir.

“Monólogo”

O prefeito se tornou uma espécie de símbolo da determinação desesperada com a qual os espanhóis estão combatendo as consequências da crise econômica que envolveu seu país e as duras medidas de austeridade impostas pelo governo.

Soria admitiu um único encontro com Vadillo desde que o prefeito começou sua greve de fome. “Nossa conversa foi uma espécie de monólogo”, diz Vadillo. “Eu expliquei minha posição, e o ministro não disse uma palavra, exceto que eu deveria reconsiderar minha posição”. Vadillo acredita que o governo está usando a crise econômica meramente como pretexto “para aprovar suas políticas conservadoras”.

Soria, de sua parte, refere-se ao estado pavoroso do orçamento espanhol e à pressão intensa da União Europeia para melhorar a situação. De fato, Bruxelas há muito vem pedindo que a Espanha corte seus generosos subsídios solares; em 2012, os cortes aprovados pelo ministério de Soria pouparão cerca de $160 milhões de euros (em torno de R$ 400 milhões). Ainda assim, a organização ambiental Greenpeace condenou os cortes dos subsídios por Soria como “sério erro histórico”, e vários pequenos fornecedores de energia também criticaram a decisão. A competitividade mundial da Espanha em um setor no qual era líder ficou limitada, dizem. Antes dos cortes, a Espanha era o lugar mais atraente do mundo para energias renováveis. Os cortes de subsídios levaram o país para o 13º lugar.

“Viver com dignidade”

“Simplesmente, o governo cedeu à pressão do lobby das grandes firmas de energia”, diz José Rivero, diretor da empresa RS Solar, que tem sede na cidade de Vadillo, Albuquerque. Antes dos cortes, a RS Solar empregava 83 pessoas. Hoje, esse número caiu para apenas 16. “A nova lei não ameaça a existência de nossa empresa, simplesmente vamos mudar de foco”, diz Rivero. “Os empregos que teríamos criado em Extremadura agora serão criados em outros projetos no México e na Argélia”.

O próprio prefeito Vadillo admite que os subsídios solares na Espanha foram generosos por muito tempo. “Talvez alguns projetos deveriam ter sido estudados mais de perto, antes de começarem a distribuir o dinheiro”, diz ele. “Mas é exatamente isso o que eu quero discutir com o ministro na mesa de negociação”. As perdas de empregos em seu município não são o único problema. A receita com impostos caiu precipitadamente como resultado, o que significa que a comunidade não pode mais pagar por projetos sociais, inclusive um lar para idosos e programas de empregos para deficientes.

Para que o prefeito na distante Madri receba apoio moral, dezenas dos moradores de Albuquerque se reúnem por meia hora toda manhã, às 10h, na frente da prefeitura. Ele também tem 4 milhões de seguidores online. “Ele é nosso herói”, diz uma mulher na frente da prefeitura. “Mas ele devia parar. Não queremos que ele morra”.

“Estou preparado para fazer tudo por meu município”, diz Vadillo em sua van. “Isso não tem a ver com sobrevivência e sim com viver com dignidade”.

Fonte: Dear Spiegel

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