(por Sandro Ferreira)
A eclosão de uma sucessão de manifestações no país é um ponto fora da curva e que pode ser caracterizado como um cisne negro: algo inesperado que pode mudar as tendências predominantes.
Mesmo sendo prematuro especular sobre o alcance dos acontecimentos, o certo é que existem algumas poucas certezas sobre o que se passa.
Uma dessas certezas é a de que a cena eleitoral de 2014 está definitivamente afetada por esses eventos. Seja pelo fato inconteste de que as redes sociais e a internet estão sendo essenciais nas mobilizações, seja pela clareza da mensagem que as classes médias altas e as franjas das classes populares estão enviando à classe política: “Estamos de saco cheio!”
Alguém em 2014 vai ser alavancado pelos rescaldos desses movimentos. No momento, parece que a ex-senadora Marina Silva é a que mais se aproxima do perfil de vencedora. Os danos na popularidade de Dilma Rousseff serão evidentes.
Outra certeza é a de que os protestos podem morrer, caso não se transformem em um projeto político claro. As passeatas de hoje têm um menu variado de temas que inclui o preço do transporte público e os gastos com a Copa, a rejeição à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, que limita os poderes de investigação do Ministério Público, a condenação da corrupção e do projeto de lei que trata da “cura gay”, além de expressar o desejo de contestar autoridades e/ou de praticar vandalismo, e por aí vai.
Tal agenda, ampla e difusa, revela a existência daquilo que Elias Canetti, em seu magistral livro "Massa e poder", identifica como massa aberta. Canetti aponta algumas características importantes no fenômeno.
A primeira é o fato de que a massa aberta reclama um interesse universal que una tudo e todos. É a busca pela universalidade ampla dos interesses em oposição a projetos específicos típicos de massas fechadas.
A universalidade do interesse das massas abertas é essencial para promover a igualdade de todos os seus participantes em torno de um objetivo comum. Porém, a mesma universalidade que pode unir é a que fragiliza e destrói a massa aberta. Pois a falta de unidade de interesses nos homens e mulheres termina rompendo a universalidade sonhada. Tal questão, hoje no Brasil, se comprova nessa agenda difusa.
Para evitar a dissipação das manifestações, o movimento deve se organizar. Em um primeiro momento, até mesmo ampliando suas agendas e incorporando reivindicações pontuais de funcionários públicos, trabalhadores, aposentados, sem-teto, sem-terra, estudantes etc.
Apenas assim prosseguirá crescendo e se consolidando em busca de um projeto de poder. Para adiante poder depurar a agenda e se posicionar claramente no ciclo eleitoral que se aproxima. Mas essa não parece ser, agora, a tendência mais evidente.
fonte: Murillo de Aragão, cientista político/ blog do noblat
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