sexta-feira, 24 de maio de 2013

Como montar sua rede WiFi na sua cidade

(por Sandro Ferreira)

Do início do projeto à liberação do acesso à população são necessários cerca de dois anos



A chegada da internet sem fio para acesso livre em uma cidade, em geral, é consequência da digitalização dos serviços municipais. A cidade que deseja se tornar digital precisará investir em infraestrutura, seja contratando operadoras de comunicações e provedores de acesso à internet banda larga, seja criando sua própria rede. O primeiro modelo pode ter menor custo no curto prazo, mas exigirá manutenção e revisão periódica de contratos, o que pode onerar o orçamento público nos anos seguintes.


Por isso, analistas sugerem que a melhor alternativa para as cidades é criar um anel de fibra óptica próprio, que passe por todas as instituições municipais, estaduais e também federais, compartilhando tecnologia e eventuais custos. No perímetro do anel, que integra os sistemas dos órgãos públicos, é possível instalar hotspots de acesso gratuito, com boa velocidade. A fibra se conecta então a um backbone, que pode ser de uma operadora, como Telebras; de uma empresa local ou municipal – Procempa, de Porto Alegre, ICI, de Curitiba, e Prodepa, do Pará, são empresas criadas para suprir as necessidades informacionais das cidades, e que acabaram se tornando as operadoras e provedoras onde atuam.
“O backbone da Telebras leva a banda larga até uma entrada da cidade e, dentro da cidade, a distribuição desse link se dá pelo backhaul de fibra que interliga os principais prédios da cidade. A partir daí se começa a distribuir a rede via WiFi”, explica Fátima Olmos, gerente de negócios e soluções do CPqD, centro de pesquisa e desenvolvimento em tecnologia que participou da implantação de diversas cidades digitais. Essa topologia não é mandatória. “Se a cidade quiser simplesmente instalar o WiFi, pode. Mas o backbone é necessário porque o tráfego nessa rede principal é maior do que no acesso da população”, diz.
Segundo Carlos Henrique de Oliveira, pesquisador e consultor também do CPqD, alguns passos são essenciais para um projeto de WiFi público funcionar com qualidade, sem frustrar a população. O momento mais importante de todos é o de planejamento, que se divide em várias fases. “Na primeira, se faz o levantamento de requisitos. Se isso não for feito de forma refinada, o projeto fica mais caro lá na frente”, diz.
Para não faltar nada no plano é preciso traçar os requisitos explícitos da rede de comunicação. Determina-se o número de hotspots, qual perfil de público atendido e locais, como postos de saúde, escolas etc. “Também determina-se requisitos implícitos: como vai ser concedido o acesso para cada participante da rede. É importante ter um controle do acesso para evitar que a banda fique muito compartilhada, o que vai irritar o usuário e tornar a experiência ruim”, diz Oliveira.
Também é preciso fazer o levantamento jurídico de funcionamento da rede, verificando quais as faixas de frequência poderão ser usadas. “A administração pública pode trabalhar com faixas não licenciadas, de 900 MHz, 2,4 GHz e 5,8 GHz (resolução 506 da Anatel), e com faixas de frequências licenciadas de 2,5 GHz e 3,5 Ghz (resoluções 544 e 537), em que parte é usada pela prefeitura para serviços dos órgãos da administração pública”, observa.

A segunda etapa consiste no site survey, ou, pesquisa de campo. Aqui, faz-se o levantamento da ocupação do espectro de frequências e da infraestrutura pré-existente. Os engenheiros determinam se as faixas de frequência a serem usadas estão disponíveis e se os locais onde haverá a instalação precisam de reformas ou ampliações. Na terceira fase acontece a predição de cobertura, baseada em softwares especializados para determinar a distribuição das redes de acesso (WiFi) e do backhaul (WiMAX ou WiMesh) para transporte dos dados até o data center da prefeitura. “O que vai determinar a experiência do usuário é um projeto criterioso destas redes em função da demanda dos usuários e dos tipos de serviços”, observa. É um aspecto importante, pois o projeto não é só cobertura de rádio, mas atendimento da capacidade de tráfego demandada.
A quarta etapa diz respeito à engenharia de tráfego, quando a prefeitura informa quais serviços vão usufruir da rede e a demanda mínima de cada um. Câmeras de vigilância, comunicação por voz sobre IP (VoIP) ou acesso a internet por dispositivos fixos e móveis, são alguns exemplos. “Nessa etapa de modelagem do tráfego, aplica-se o fator de overbooking. Não se deve fazer o planejamento com base no pico, pois isso deixa a rede ociosa na maior parte do tempo”, diz.
Por exemplo, um terminal VoIP precisa de uma rede de 256 kbps para funcionar satisfatoriamente, mas nem todos os terminais serão usados ao mesmo tempo. Com base em observações da forma de uso, os engenheiros de telecomunicações chegaram a um fator de overbooking de 4:1, segundo o qual é possível ter até quatro usuários no mesmo canal em momentos distintos. “Para uso de internet, o fator pode ser ainda maior”, ensina Oliveira.
Depois de tudo isso, vem a especificação dos equipamentos necessários para a construção da rede e a elaboração do projeto básico de referência. “Quanto mais completo estiver, melhor”, reforça Oliveira. Por fim, vêm as fases da licitação, acompanhamento da implantação, testes de aceitação e comissionamento da rede. Do planejamento à conclusão, em média, passam cerca de dois anos.
Por conta de tantas etapas e das necessidades específicas de cada município, é difícil estabelecer um custo médio por projeto. Mas é possível estimar o custo por quilômetro de fibra instalada, de ligação aos pontos e criação dos hotspots. Segundo Rogério  Santanna, ex-presidente da Telebras e atual consultor em governo eletrônico e telecomunicações,  “uma cidade média, que faça 10 km de fibra óptica, vai gastar cerca de R$ 1,5 milhão para fazer o backbone e R$ 850 para fazer a ligação por ponto com fibra óptica. Além dos custos dos hotspots”. Nesse caso, o preços dos equipamentos variam conforme as necessidades, como alcance do sinal e recursos de segurança.

Santanna chama a atenção para a importância do planejamento a longo prazo, prevendo a expansão da rede ou crescimento do consumo de banda: “O tráfego cresce no mínimo 10% ao ano. Se o crescimento da cidade ou da rede for acelerado, pode aumentar em até 30% a cada ano”. Prefeituras e estados não podem explorar comercialmente o acesso à internet; por isso, caso seja necessário obter recursos, a solução é recorrer a parcerias com provedores locais. Por fim, ele reforça que apenas dar acesso não é política pública. “Para ser uma cidade digital, tem de oferecer acesso gratuito em espaços públicos, praças, parques, órgãos da administração pública. Mas, também, é preciso oferecer serviços de governo eletrônico, como emissão de alvará e licenças”, lembra. (R.B.B.)
fonte: ARede nº 91 - maio de 2013

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