(por Sandro Ferreira)
Afável, frágil, determinada, por escolha e por natureza, ela parece fugir de padrões. Aos 55 anos, Marina Silva está voltando ao primeiro plano do cenário político brasileiro, menos de dois anos depois de ter saído do Partido Verde, com o qual obteve 20 milhões de votos na eleição presidencial de 2010 e tirou uma vitória de primeira de Dilma Rousseff, sucessora de Luiz Inácio Lula da Silva. Um desempenho sem precedentes para uma candidatura ambientalista em uma grande democracia.
Com a mão estendida, o rosto marcado pelo cansaço, a ex-ministra do Meio Ambiente do presidente Lula nos recebe em uma sala de reuniões vazia de um prédio sem graça de Brasília, como se para enfatizar melhor a distância que a separa de seus principais adversários. "Eles fizeram de tudo para impedir nossa existência", ela sussurra.
LEIA MAIS
- Marina Silva: 'Feliciano está sendo criticado por ser evangélico, não pelas posicões equivocadas'
- Adriana Calcanhotto e Nando Reis fazem show para apoiar partido de Marina Silva
- Marina Silva ironiza entrada de Afif em ministério
- Marina vê 'ação desmedida' do governo em aprovar projeto que inibe novos partidos
Dois meses de áridas batalhas para obter o reconhecimento de seu novo partido, criado em fevereiro, a Rede Sustentável, a convenceram de que os pesos pesados da coalizão governamental, o Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda) e o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB, centro), estavam dispostos a tudo para evitar uma nova "surpresa Marina" na eleição presidencial de 2014.
"Crise de civilização"
No dia 18 de abril, a Justiça lhe deu um primeiro sinal verde para a inscrição de seu partido no registro oficial. "Agora eles estão tentando suprimir o acesso à propaganda eleitoral gratuita para os novos partidos", ela diz. "É exaustivo. Consegue imaginar uma máquina de guerra como essa por alguns segundos de aparição diária na TV?" E complementa: "O que eles não entendem é que quanto mais se tenta sufocar um partido, mais ele cresce. Veja o PT, por exemplo, os militares fizeram de tudo para silenciá-lo na época."
Marina Silva é isso. Uma candidata da adversidade, com uma fala determinada sob a aparência de um corpo frágil, outrora maltratada pelas durezas da vida na Amazônia, sua terra de origem: "Estamos vivendo uma crise de civilização – econômica, social, ambiental, ética e política. Não é fácil enfrentar tais mudanças. Mas o principal é se conscientizar de que a única saída é a implantação de uma verdadeira política de desenvolvimento sustentável."
Coragem não falta para Marina. A ascensão dessa ambientalista de primeira hora lembra a de Lula, o filho pobre do Nordeste que se tornou presidente. Oriunda de uma família numerosa – três dos irmãos não sobreviveram à miséria e à malária, órfã aos 14 anos, ela logo foi obrigada a se tornar seringueira em plena selva do Estado amazônico do Acre. Doente de malária e hepatite, ela foi se tratar em Rio Branco, capital do Estado. Foi lá que, aos 16 anos, fez um curso de alfabetização em uma comunidade religiosa, trabalhou como empregada doméstica, pensou em virar freira e por fim ingressou na universidade e se formou em História. Militante contra a ditadura, ela era próxima de Chico Mendes, o ícone do ambientalismo assassinado em 1988.
Dilma Rousseff "não fez nada em dois anos"
Naquele ano, sob a bandeira do PT criada pelo metalúrgico Lula, ela se tornou a vereadora mais votada de Rio Branco. Deputada na Assembleia Legislativa do Acre, aos 35 anos ela se tornou a mais jovem senadora da história do Brasil. Reeleita em 2002, entrou para o governo Lula com a pasta do Meio Ambiente.
"Nós realizamos muitas coisas", ela diz. "As emissões de CO2 foram reduzidas em dois milhões de toneladas, o desmatamento recuou 80% e cerca de 120 mil hectares de terras foram atribuídos aos índios. E o que a maioria presidencial fez até agora? Com a reforma do código florestal ou ainda as modificações dos direitos de exploração mineradora, ela está ameaçando essas conquistas."
Apesar da grande estima que tem por Lula, Marina Silva deixou o governo e o PT em 2008, depois de ter que engolir a aliança do governo com o complexo agroindustrial, a legalização da soja transgênica e a construção de usinas hidrelétricas na Amazônia, uma questão na época defendida pela ministra de Energias, Dilma Rousseff, que "não fez nada em dois anos, a não ser por um retrocesso nas questões ambientais", ela lança com um olhar severo.
"Referendo sobre o aborto"
Candidata presidencial do Partido Verde em 2010, Marina Silva passava a imagem de uma personalidade contraditória, socialmente conservadora e politicamente progressista. Membro desde 1997 da Assembleia de Deus, uma das principais Igrejas evangélicas do Brasil, ela se posicionou contra o aborto, independentemente das circunstâncias. Hoje ela parece ter mudado: "Isso faz parte dos temas complexos que merecem ser discutidos. Assim como para a legalização da maconha, sou a favor de um referendo sobre essa questão do aborto."
Para aquela que se considera a "guardiã das utopias", a próxima campanha promete ser acirrada. Marina diz ter coletado, até o momento, 200 mil assinaturas das 500 mil necessárias, antes do início do mês de outubro, para entrar na corrida presidencial. "O movimento vai se acelerar, as equipes estão se posicionando."
Além da candidatura do principal partido de oposição, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Marina Silva poderá ser seguida de perto pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, a estrela em ascensão do Partido Socialista Brasileiro (PSB), que faz parte da coalizão governamental. Ela despreza essa possibilidade: "O que ele representa no país?"
Hoje, duas pesquisas lhe dão de 16% a 18% das intenções de voto, bem atrás dos 54% da presidente Dilma Rousseff, que vai se recandidatar. "Acredite, está havendo uma mudança de paradigma. Esse país possui o potencial de ser no século 21 o que os Estados Unidos foram no século 20."
Tradutor: Lana Lim
Nenhum comentário:
Postar um comentário