(por Sandro Ferreira)
A caminho de virar um poço de lama, 38 anos depois de ser inaugurada com capacidade para armazenar 26 milhões de metros cúbicos de água, a Barragem de Brotas, em Afogados da Ingazeira, parece página virada. Antes, a água se perdia na imensidão da sua amplitude adentrando o leito do Rio Pajeú. Hoje, não. A barragem parece uma cacimba ou um riachinho.
A mais implacável seca dos últimos 50 anos reduziu um dos maiores reservatórios do Sertão de Pernambuco a um açudeco, onde a água que se retira vai se acabando lentamente, como uma morte anunciada. Nem os peixes estão resistindo ao lamaçal.
Acostumado a jogar a rede e arrastar traíras, corróis e pirambebas, Siqueira Pescador está se despedindo da atividade que sustentou sua família pelos últimos 20 anos. “O peixe está acabando e quando a gente ainda consegue pescar alguma coisa tem que tirar a lama”, diz Siqueira.
Os peixes, na verdade, não apresentam apenas resquícios de lama, mas também um cheiro desagradável. Tudo porque os que resistem à pouca quantidade de água no açude estão sendo pescados numa extensão em que há mais lama do que água de verdade. Por isso mesmo, os próximos dias serão os da última pescaria em Brotas.
A Compesa, por sua vez, já deu o veredicto: Brotas só tem água suficiente para abastecer Afogados da Ingazeira e Tabira, cidade vizinha, por mais 15 dias. Depois, a primeira cidade será abastecida pelo Sistema Zé Dantas, alimentado por poços artesianos. A segunda, de forma mais sofrida, por carros pipas.
Ao longo de quase 40 décadas alimentando o sistema da Compesa, Brotas vai morrendo e deixando para trás um rastro de destruição: mais de 200 famílias de pescadores, por exemplo, terão que buscar outra atividade distante de Afogados da Ingazeira.
“Eu pescava quase todos os dias aqui e dava para fazer a feira da minha família”, diz Luiz Santos, encontrado por este blogueiro fazendo uma das suas últimas pescarias. De agora em diante, ele disse que procurará explorar sua atividade em reservatórios da região que ainda não secaram, como a Adutora do Rosário, em Iguaracy, a 20 km.
No semblante de Luiz e de Siqueira Pescador, dois homens simples e trabalhadores, sinais de tristeza, cansaço e desapontamento. “Nunca imaginei um dia assistir a uma cena dessas”, disse Siqueira, apontando em direção ao leito da Barragem de Brotas. Para ele, a morte de Brotas é o sepultamento também da atividade pesqueira em Afogados.
Brotas nasceu pelas mãos do ex-governador Eraldo Gueiros, que a inaugurou antes de ficar pronta. Sucessor de Gueiros, Moura Cavalcanti deu sequência ao que faltava e completou sua infraestrutura. Mas o tempo passou e nenhum governador cuidou da barragem. Resultado: seu abandono se transformou em agonia e, depois, em morte.
A população, entretanto, ainda tem esperanças de assistir ao renascimento da barragem, que quando secar completamente, em no máximo 15 dias, passará por um processo de desassoreamento para se preparar para o próximo período de chuvas na região.
A esperança que resta está numa boa invernada em 2014, capaz de fazer o milagre de encher o reservatório e devolver vida em abundância, com muitos peixes, para compensar a difícil travessia que os pescadores terão que fazer desde já, a espera da abertura das torneiras celestiais.
fonte:blog do magno
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