domingo, 21 de dezembro de 2014

PACTO NACIONAL PELO FORTALECIMENTO DO ENSINO MÉDIO NO BRASIL (UMA CONTRIBUIÇÃO PARA O DEBATE)

    Professores cursistas do Sismédio.


          
Por Dedé Rodrigues

O Curso de Formação continuada de professores e coordenadores pedagógicos do Ensino médio que está ocorrendo no Brasil e também na Escola Arnaldo Alves Cavalcanti em Tabira e que tem como coordenadoras dos cursistas da nossa escola as Professoras Rosineide e Margarete, foi encerrado  o V encontro do ano neste mês de dezembro de 2014. Nesta matéria eu vou destacar algumas questões que considero relevantes do curso, tendo como base os relatórios individuais e coletivos, mas acrescentando outras contribuições dos pesquisadores e professores como João Francisco de Sousa, Paulo Freire e Moacir Gadotti com o objetivo de contribuir com o aprofundamento das reflexões e dos conflitos ocorridos nos debates em nossa escola, mas com certeza, ocorridos também, nas suas devidas proporções, em outras escolas, já que a nossa escola e as outras não são ilhas separadas do Brasil. Nesta matéria apontarei algumas causas da crise do Ensino Médio, a importância da relação professor-aluno, aspectos do conhecimento dialético de mundo, a função da educação: adaptação ou libertação? Evasão escolar, interdisciplinaridade, autoritarismo, autoridade, liberdade,  a dialética e o conflito, desenvolvimentismo+ socialismo X neoliberalismo no mundo, gestão democrática, cidadania e a disputa no Brasil entre a democracia representativa neoliberal e democracia participativa e desenvolvimentista,  culturas, bem como,  a relação de tudo isto com a nossa escola e com o nosso fazer pedagógico. 
  


A apostila que está norteando o curso considera que “o ensino médio talvez seja um dos mais problematizado na história da educação, pois manifesta o nó da relação social implícita no ensino escolar nacional”.  (CURY, 1991).  O problema deste curso estaria na própria organização do ensino brasileiro, desde o Império, fragmentado, com aulas avulsas e reproduzindo a ideologia elitista e dominante. Esta ideologia contribuiu para a naturalização das diferenças e desigualdades entre as classes sociais no Brasil até os dias atuais. De forma que os problemas da educação no Brasil são históricos, tendo como pano de fundo, uma educação feita no período Imperial pela elite e para a elite, como deixa claro neste trecho da apostila que, “o Colégio Pedro II foi criado com o propósito de formar as elites nacionais, os altos quadros políticos, administrativos e intelectuais do país”. De lá pra cá muitas coisas mudaram, especialmente nos últimos 12 anos, mas os desafios continuam, pois na essência o ensino brasileiro ainda é elitista, porque ele reproduz também uma sociedade muito desigual camuflando - em todos os aspectos - político, econômico, cultural e social esta desigualdade.


É fato constatado por pesquisas que o Ensino Médio no Brasil atravessa uma profunda crise. A escola, muitas vezes, está distante ou fora dos interesses do jovem do século XXI.  Os professores são vistos como alguém que pouco acrescenta na vida dos jovens. Por isto torna-se urgente também para o docente conhecer mais cada aluno de cada turma para poder compreendê-lo melhor.  Duas coisas eu considero fundamental para avançar na direção de compreendermos melhor o nosso aluno: Conhecê-lo mais por intermédio de pesquisas e avaliações individuais e ter uma boa relação com ele. Freire nos ensina que “quanto mais me dou à experiência de lidar sem medo, sem preconceito, com as diferenças, tanto melhor me conheço e construo meu perfil”. E continua: “O diálogo é o encontro amoroso dos homens que, mediatizados pelo mundo, o ‘pronunciam’, isto é, o transformam, e, transformando-o, o humanizam para humanização de todos.” (Freire, 1975:43).  Isto quer dizer que se o professor se relaciona bem com o seu aluno e procura o conhecer melhor, a partir do respeito à diversidade e diferenças em sala de aula, dialoga e o respeita, mais constrói no trabalho pedagógico um perfil adequado nele mesmo e ajuda a transformar o mundo.  


Além da necessidade do Professor conhecer mais o seu aluno, torna-se também necessário ele conhecer mais o mundo, ter um filosofia de vida e de mundo.  É preciso o docente ampliar o campo conceitual sobre os fenômenos sociais e a crise do ensino médio que está relacionada, conforme nos ensina à dialética,  com a crise do sistema capitalista.   Neste sentido o principal culpado dos nossos maiores problemas é o modo de produção capitalista, individualista e predatório, mas o modo de produção é uma criação humana, pode ser transformado, substituído.  Não é justamente o que sugere a apostila que é preciso conhecer o particular para chegar ao conhecimento total? E o total não é o modo de produção capitalista? Não é a adaptação do indivíduo a este sistema contraditório e excludente que predomina ainda no ensino médio? Como adaptar o nosso aluno a um sistema injusto que precisa mudar? Paulo Freire nos ensina o contrário. Esta contradição sistêmica precisa ser superada. 


Aprofundado esta questão,  Gadotti em Concepção Dialética da Educação, pág. 13, afirma que “tanto a educação do homem feudal quanto a educação do homem burguês tem uma finalidade muito definida: adaptar as novas gerações a um modelo de sociedade”. É claro que estes modelos de sociedade interessavam as elites, mas será que sempre foram interessantes para os trabalhadores, os servos e os operários?  É consenso entre educadores progressistas que a educação precisa tornar-se um instrumento de libertação do homem da ignorância e em consequência também da sociedade capitalista opressora. Para a libertação do homem torna-se necessário o conhecimento profundo das contradições do próprio sistema capitalista. Para isto Marx aponta por intermédio da dialética que “no estudo da estrutura econômica da sociedade capitalista existe uma contradição básica entre o caráter social da produção e o caráter privado da propriedade”. Esta contradição do sistema também precisa ser superada.  Para Marx, “educador e educando educam-se juntos na práxis revolucionária, por intermédio do mundo que transformam”. (Gadotti, 1994: 43). 
     

 Segundo Marx “O ensino Burguês é necessariamente elitista, discriminador. Para que os filhos das classes dominantes possam estudar é preciso reprovar todos os outros. Na verdade a chamada evasão escolar nada mais é do que a garantia para as classes dominantes de que continuarão a se apoderar do monopólio da educação”.  Deste modo a divisão das disciplinas impede formação humana integral que buscamos, fragmenta o conhecimento, estimula a competição individual e a reprovação. O nosso curso busca formar o docente para adquirir uma prática na escola interdisciplinar, mas esta prática encontra muita dificuldade no tipo de sociedade que a gente tem, na qual, o fragmento é mais importante que o todo, o indivíduo é mais importante que o coletivo.  Nesta sociedade capitalista, na qual tudo vira mercadoria, a educação como um bem social sofre os efeitos desta concepção ou filosofia de vida burguesa privatista. Para os trabalhadores, professores, pais e alunos,  não é interessante que a educação seja um bem privado, pois, neste caso, só teria acesso à escola de “qualidade individual” os detentores dos meios de produção ou da riqueza, nós devemos perseguir a formação humana integral que só acontecerá numa educação pública e de qualidade social e com a vivência prática da interdisciplinaridade. 


O nosso curso mostrou também outro aspecto que deve ser estudado: o conflito de ideias entre professores acerca das questões educacionais em debate.  Para aprofundar isto cabe aqui uma reflexão dialética: “A harmonia na instituição escolar será sempre aparente. Só é harmoniosa a instituição que é opressiva. Uma instituição educadora será sempre um lugar de conflito, de debate, de crítica, de desconforto. Os que buscam a vida, os que vivem, serão sempre inconformados. Só a morte é harmoniosa, repouso, eliminação de conflitos”. (Gadotti, 1994: 106). É bom saber que os diversos conflitos de ideias em nossa escola é o reflexo dos conflitos de classes da nossa sociedade. Neste debate vai se firmando inevitavelmente, conscientemente ou não, dois lados: um lado progressista que aposta nos avanços de interesse da classe trabalhadora que o curso propõe e outro lado conservador, burguês, que resiste às mudanças propostas pelo curso. Não é tentando manter uma dada situação que alguns professores resistem a tratar o aluno como sujeito de direito? Não é a resistência de alguns professores a alunos do Grêmio Estudantil um viés conservador? E a negativa de alguns professores em dar mais oportunidades de reensino ou de recuperação de alunos com dificuldades não é uma forma de autoritarismo? A falta de diálogo respeitoso, aberto e franco entre professor-aluno não é também outra forma de autoritarismo? Veja o que diz Gadotti sobre isso: “A educação é um processo contraditório (unidade e oposição), uma totalidade de ação e reflexão: eliminando a autoridade caímos no espontaneísmo libertário onde não se dá educação; eliminando a liberdade, caímos no autoritarismo, onde também não existe educação, mas domesticação ou puro adestramento. O ato educativo realiza-se nesta tensão dialética entre liberdade e necessidade”. (Gadotti, 1994: 74).   


Além de compreendermos que o conflito é inerente ás sociedades de classes como a nossa, é preciso também entender que “o conflito é parte integrante do processo de humanização. Por isso temos que entender o papel dos conflitos na dinâmica das relações interpessoais, sociais, políticas, econômicas, enfim, culturais. Temos que enfrenar os conflitos surgidos de forma positiva. Precisamos manejá-los de tal maneira que eles contribuam para o nosso crescimento pessoal e coletivo, para afirmar o EU em nossa COMUNIDADE”. (João Francisco, 2001: 204). Observe que o autor encara o conflito de forma positiva, dialética, como algo necessário às mudanças que precisamos realizar na escola e na sociedade.


As mudanças que estão acontecendo e, as que precisam ainda ser feitas no Ensino Médio, estão relacionadas com as mudanças que estão ocorrendo e, as que ainda precisam ocorrer, no Brasil. O mundo atual vive um conflito entre o neoliberalismo, ideologia que dá suporte a globalização capitalista, imposta pelos países ricos centrais contra o desenvolvimentismo e o socialismo que resistem na América Latina e na maior parte da Ásia. Estudar a educação desconectada disto é no mínimo negligenciar a dialética. O próprio curso que estamos fazendo é resultado do Governo Progressista e desenvolvimentista de Dilma Rousseff no Brasil. Neste processo há uma disputa ou queda de braço em nossa sociedade entre os neoliberais (PSDB, DEM e PPS) contra o (PT, PC do B, Parte do PSB, PSOL etc.) Para aprofundar ou não a nossa democracia. Mudar o Ensino médio como propõe o nosso curso: mais democracia, mais transparência, mais direitos, mais qualidade social não interessa aos neoliberais. Hoje há uma disputa no Congresso Nacional que ampliará ou não a participação dos movimentos sociais como norteadores dos governos, bem como, os direitos sociais e a distribuição de renda. Esta mudança é a proposta do Decreto de Participação Social da Presidenta Dilma que foi derrubado pelos neoliberais acima depois da eleição deste ano, na Câmara de Deputados. Este embate entre neoliberais e desenvolvimentistas explicita a disputa que agora está ocorrendo no Senado brasileiro. Os movimentos sociais populares na América Latina e no Brasil  “apostam na possibilidade de garantir o aprofundamento, a extensão e a radicalização das democratizações que possam vir a configurar um socialismo latino-americano”), (Souza, 2001, 118). Os casos da Venezuela, Colômbia e Equador são mais elucidativos. O Brasil ainda não está numa situação similar a estes países, mas caminha para ela. “A democracia diz respeito aos problemas da luta pela satisfação das necessidades e dos interesses ligados às questões da sobrevivência, do trabalho, da atividade produtiva, e seus correlatos – alimentação, saúde, educação – como instrumento de mobilidade social”.  (Ib:118).  Mudar o Ensino Médio será uma das nossas contribuições com todo este processo de mudanças que está ocorrendo neste momento histórico no Brasil e no mundo.

Está atento, tomar partido, sem partidarizar o trabalho pedagógico e ficar por dentro desta conjuntura nacional e mundial é um dever do educador revolucionário contemporâneo. Posicionar-se sobre a questão das disputas pelo grande poder político mundial, de um mundo unipolar (só os EUA, aliado à parte da Europa,  mandando com a politica neoliberal) para um mundo multipolar, socialista e desenvolvimentista, com a divisão do poder entre (a China, Rússia, Brasil etc.) Este segundo bloco vai se firmando cada vez mais no mundo e é o que mais interessa a nós professores progressistas. Neste contexto este curso vai deixando mais claro que nas escolas há uma disputa que favorece mais a um lado ou ao outro, ou seja, à democracia liberal meramente representativa e neoliberal ou à democracia participativa, desenvolvimentista ou socialista. “Esta perspectiva implica que a escola se pense como uma cidade a construir, ou seja, que se pense não só como espaço de formação do cidadão, mas principalmente como um espaço de exercício de uma cidadania que não se limita a aprendizagem da disciplina e das regras, mas que institua uma cultura dos direitos e da participação democrática”.  (Ib Souza:135). 
    

 Neste sentido, o curso nos ensina que, para a gente perseguir a formação humana integral, devemos ter o aluno como protagonista, respeitar os seus direitos, e a pesquisa como recurso pedagógico muito importante. A sala de aula deve ser um ambiente democrático, na qual, a provocação do professor sobre o debate de ideias, teorias, pesquisas, as reflexões e os questionamentos dos alunos possam fluir livremente.  A nossa contribuição neste processo deve ser a de apoiar e fortalecer os órgãos colegiados da escola, a gestão democrática, o Conselho Escolar e o Grêmio Estudantil para ajudar a construir a cidadania ativa em nosso aluno. Esta é uma contribuição indispensável ao educador progressista. No mais Souza nos ensina que “Trata-se de construir a unidade na diversidade, lutar pelo sonho possível, pela utopia necessária, que para Freire implica sua concepção de interculturalidade e multiculturalidade, pela superação da guetização e do assimilacionismo na interação crítica entre culturas ou traços culturais; numa palavra, do enriquecimento das diferentes culturas e ou traços culturais em presença. Enfim, poder-se-á chegar à construção de uma sociedade democrática, não apenas representativa, mas participativa”. Cuja sociedade, a meu ver, como professor revolucionário, aponta para o socialismo do século XXI. 


José Rodrigues dos Santos ( Dedé Rodrigues) Pós - graduado em Programação do Ensino de História, com curso de Sociologia e Curso de Professor Formador pelo  Partido Comunista do Brasil -PC do B.    








                

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