terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Paulo Nogueira: O veneno da edição da entrevista de Venina


600 milhões de reais por ano para a Globo fazer um jornalismo como aquele que se viu na entrevista com Venina no Fantástico. Um mensalão eterno de 50 milhões. Foi minha primeira reflexão depois de ler a transcrição da entrevista.

Por Paulo Nogueira*, no Diário do Centro do Mundo


Reprodução
Venina durante entrevista para a GloboVenina durante entrevista para a Globo
A edição é venenosa à sua maneira. A Globo, para se preservar, não grita como a Veja. Só que cuida de despejar sobre sua audiência o mesmo tipo de veneno, apenas mais sutilmente, mas com o mesmo resultado e com a mesma finalidade.

O veneno não estava em Venina. Ela está contando sua história, e cabe averiguar.

A maldade estava na maneira como Venina foi usada.

Dilma, no final, é citada – pela Globo. Numa tentativa de desmoralizá-la, a Globo diz que Dilma afirmou que não existe uma “crise de corrupção”.

No meio de uma entrevista que trata exatamente de corrupção, a frase de Dilma parece o triunfo do cinismo.

Mas o cinismo é da Globo. É mais uma tentativa, como Roberto Marinho fez tantas vezes primeiro contra Getúlio e depois contra Jango, de rotular como corruptos regimes que não garantem a manutenção de mamatas e privilégios a um pequeno grupo.

A Globo faz assim, tradicionalmente: cala quando a corrupção é amiga. Na ditadura, quando a empresa virou um gigante, corrupção não existia, numa troca macabra de favores.

Sob Sarney e FHC, amigos e aliados, também não. Para a Globo, sequer a compra de votos da reeleição de FHC foi notícia.

Agora, o amigo Aécio também goza de imunidade. Que cobertura a Globo deu ao aeroporto de Cláudio? E ao helicóptero com meia tonelada de pó dos Perrelas, amigos fraternais de Aécio? A Globo é assim: também os amigos dos amigos recebem tratamento especial.

A este tipo de comportamento delinquente jornalístico se junta o descaro com que a Globo sonega – uma forma de corrupção que, se não combatida, destrói a economia de qualquer país.

Claro que Lula não poderia também escapar da edição da entrevista.

Venina repete uma frase segundo a qual seu chefe, em certo momento, teria olhado para um retrato de Lula e dito que ela estava colocando em risco muita coisa.

Este alegado olhar numa alegada conversa é o bastante para a Globo, na edição, incluir Lula na trama.

Lula, o espectador do Fantástico, não quis conceder entrevista sobre o assunto.

Que a Globo esperava? Que ele dissesse que aquele não era seu retrato? Que se o presidente fosse FHC jamais seria citado? Que a Globo devia mostrar o Darf?

Fora isso, o que se viu foi o jornalismo preguiçoso e declaratória. Venina diz que contratou os serviços da empresa do então namorado e depois marido porque ela era realmente “boa”. Foram mais de 7 milhões de reais para a empresa do namorado, sem licitação. Por que a Globo não foi investigar a suposta excelência da empresa favorecida?

De novo: 600 milhões por ano em dinheiro público, via propaganda federal, para a Globo fazer este tipo de jornalismo.

Você certamente conhece a tese da “servidão voluntária”, de um grande amigo de Montaigne, La Boetie.

Ele dizia que povo nenhum estava obrigado a aturar tirania nenhuma. Bastava se insurgir.

O governo do PT, ao financiar por iniciativa própria a Globo et caterva, pratica exatamente a servidão voluntária de que La Boetia falava.

Paulo Nogueira* é jornalista, fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário