A eleição de Marcos Feliciano, para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, da Câmara dos Deputados, nos impõe um questionamento sobre a nossa luta pelos direitos humanos no Brasil. Podemos nos perguntar: que direitos humanos são esses?
Por Andrea Cristiana*
As visões deturpadas contaminam corações e mentes de pessoas que desconhecem as conquistas em favor da justiça social. Reproduzem no cotidiano e nas redes sociais, nos facebook da vida, preconceitos explícitos. O discurso é, cada vez mais, fundamentalista com origem de classe e de religião, diante de garantias como o direito a escolher o afeto; a quem e como amar; direito a ter uma união civil entre casais homoafetivos; de constituir uma família, direito a ter uma vida digna para todos.
Não tenhamos dúvida. São contra essas conquistas sociais dos últimos anos, garantidas pelo Estado Laico e pela Constituição Brasileira, que a bancada religiosa se articulou para conquistar a presidência da Comissão.
Seria legítimo articular-se politicamente para ocupar a representação, caso não houvesse nessa artimanha política rastros de intolerância, desrespeito às pessoas e aos grupos sociais como a comunidade de homossexuais, lésbicas, transgêneros, trabalhadoras do sexo, homens e mulheres que lutam pelo direito a decidir sobre o que faz com o seu corpo e sobre suas relações afetivas, sem que nenhum discurso de matriz religiosa os condene. Também são contra os direitos das comunidades quilombolas, indígenas, contra o trabalho livre sem exploração escrava; contra os negros e pobres presos nas cadeias públicas brasileiras que essa bancada se articulou.
Essa artimanha política pode ser comprovada pela composição da comissão. Dos 12 votantes que elegeram Marcos Feliciano, seis eram do Partido Social Cristão. Fato inédito, pois as seis cadeiras foram cedidas por parlamentares do PMDB, PSDB, PTB e PP. Os demais eram integrantes da bancada evangélica. Apenas um parlamentar votou em branco, outros seis se retiraram da comissão. O PT, que pela sua história de luta deveria ter permanecido na Comissão, preferiu ocupar as Comissões de Seguridade Social e Família, Relações Exteriores e Comércio e Constituição e Justiça. Assim, cedeu espaço para que grupos conservadores ficassem na Comissão.
Pauta prioritária dos partidos de esquerda nos últimos 30 anos, após a ditadura civil-militar, os direitos inalienáveis à vida humana correm o risco de terem a sua agenda definida por preceitos conservadores, de reprodução de ideias de homofobia, racismo e de toda ordem de intolerância. Porque, quem não tem tradição de respeito ao outro não pode conduzir bem uma Comissão que tem a finalidade de garantir justiça social e o direito à diversidade.
E ai reside a triste constatação: de que Direitos Humanos estamos falando? A luta heroica em favor da justiça social, combate à opressão, à violência, à discriminação tem tido o descrédito de parte da sociedade. Falamos de Direitos Humanos e consideramos que se referem aos “direitos de bandidos”. É em nome da incompreensão do que sejam os direitos humanos que se alastram práticas de intolerância disseminadas em cada canto do país. Infelizmente, a bancada religiosa se fortalece no Congresso Nacional, porque parte do eleitorado brasileiro é conivente com o desrespeito e com toda ordem de violência.
*Andrea Cristiana é professora da Universidade do Estado da Bahia na cidade de Juazeiro, pesquisadora na área de direitos humanos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário