Embora geograficamente o pontífice esteja correto – ele é do sul da argentina –, a afirmação esconde a verdadeira decisão da cúria romana, Francisco I foi eleito com o mesmo objetivo que João Paulo II a mais de 30 anos atrás, a época o pontífice ajudou a desarticular a esquerda europeia, abrindo caminho para a vitória do capitalismo no leste europeu.
Por Ismael Cardoso, UJS*
Bergóglio lutará para retomar o protagonismo da igreja, com uma linha parecida com a de João Paulo II, derrotar a esquerda, desta vez, na maior região católica do mundo, a América latina.
Voltemos ao passado. Em 1978 assume o pontificado o Papa João XXIII, com um discurso mudancista e de combate à corrupção interna, é apoiado pela teologia da libertação. João XXIII propõe alterações radicais no banco do vaticano e na própria cúria romana, ou seja, busca desarranjar o esquema daquela igreja extremante reacionária e corrupta.
Em 1976, o Partido Comunista Italiano (PCI) alcança 35% dos votos nas eleições, seu secretário geral, Enrico Berlinguer, propõe um acordo para unir o país, o chamado “compromisso histórico”, que se resumia numa aliança entre os comunistas e a democracia cristã (aliados do Papa João XXIII), partido do primeiro ministro italiano Aldo Moro. O acordo foi aceito por Moro.
Ora, vivíamos em plena guerra fria, de um lado a OTAN (Organização do Trato do Atlântico Norte), braço militar dos países ocidentais, de outro lado o Pacto de Varsóvia, aliança militar formada em 1955 pelos países socialistas, como o próprio nome diz, o pacto é realizado na Polônia, maior país católico dos países socialistas.
Neste momento a bola estava nos pés dos progressistas, na fé e na política.
Sendo a Itália um país membro da OTAN, o papa alinhado com a esquerda e o governo dirigido numa aliança católico/comunista, algo cheirava mal para os países capitalistas, a OTAN estava em xeque.
Só havia uma opção, desarranjar o pacto de Varsóvia antes que o mesmo desarranjasse a OTAN.
O plano é posto em ação, as peças se encaixariam como um brinquedo de lego. Se de um lado a direita católica queria ver João XXIII fora do trono, os EUA queriam Aldo Moro e o PCI fora do poder na Itália.
Em 9 de março de 1978, Aldo Moro é assassinado depois de ter sido sequestrado pela brigada vermelha (os trotskistas na contra revolução, como sempre!). O historiador Sergio Flamigni aponta que as brigadas teriam sido usadas pela Gladio, rede de espionagem italiana dirigida pela OTAN. Com o sequestro e morte de Aldo Moro, o compromisso histórico é completamente desarticulado.
Ora se antes o problema geopolítico se concentrava na Itália, com a derrota da esquerda neste país chegava a hora de uma nova ofensiva contra o leste europeu e, Karol Wojtyła, cardeal polonês, era a ultima peça deste imenso lego sinistro da guerra fria, uma peça de encaixe perfeito.
Em Setembro de 1978, depois de um mês de papado, João XXIII é encontrado morto em seus aposentos no vaticano, esta história é retratada pelo filme O poderoso Chefão. Outras duas mortes ainda pouco explicadas pairam como sombras no vaticano, o banqueiro italiano Calvi, que tinha relações com a igreja, é encontrado enforcado sob uma ponte de Londres com os bolsos cheios de pedra e, por ultimo, a morte do Camerlengo, Jean-Marie Villot, que havia feito à transição de João XXIII para João Paulo II.
Em meio ao conchavo sinistro da cúria, elege-se João Paulo II, como já disse acima, a Polônia era o maior país católico dos países socialistas. Enfim, o jogo se inverte, o Papa é de direita, porém de um país socialista, país sede do pacto de Varsóvia, xeque mate! O final da história já conhecemos.
Bergóglio é jesuíta, uma das doutrinas mais disciplinadas dos católicos, disciplina militar para uma igreja em guerra com a esquerda, católica e não católica. A argentina vive um momento de radicalização política, em muitos casos, em choque direto com a igreja católica, o próprio Bergóglio é tido como uma espécie de líder moral da oposição. A argentina é o 11º país mais católico do mundo, são cerca de 31 milhões de fiéis, sem o incomodo da igreja evangélica. Bergóglio, ao contrário de Bento XVI, é popular, vai a campo, ao povo, ou seja, um general de front e não de quartel, pois, os católicos não desejam uma nova teoria, mas, um novo rebanho, novas conquistas.
A América latina é sem dúvida o continente que se avermelha neste momento da história, a luta pelo socialismo pulsa por todos os cantos abaixo da linha do equador. A derrota da igreja católica aqui, seria a maior de toda a sua história, por tanto, a escolha de Bergóglio não é fortuita, assim como o polonês, o argentino do fim do mundo surge como uma peça chave para evitar o fim da igreja.
Esqueceu-se, no conclave, de uma frase muito importante de Karl Marx, “a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”.
* Ismael Cardoso é estudante de ciências da natureza da USP, diretor de comunicação e solidariedade internacional da UJS
(título original "A geopolítica e a luta contra a esquerda no centro do vaticano" alterado por redaçãoVermelho)
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