(por Sandro Ferreira)
Sendo originário da Idade da Pedra ou do período Neolítco, o carro de boi surgiu no Brasil com os primeiros engenhos de açúcar, na época da colonização portuguesa. E ainda hoje o carro de boi faz parte da paisagem rural do Nordeste brasileiro.
Foi um dos primeiros instrumentos de trabalho, além do mais antigo e principal veículo de transporte utilizado no país, principalmente nas áreas rurais, por quase três séculos.
O carro de boi é movimentado, em geral, por uma ou mais parelhas de bois, e guiado por carreiro. Na mão ele tem uma vara comprida com um prego na ponta: é o ferrão. Com o ferrão ele espeta o boi que está fazendo corpo mole, ou o boi que está indo na direção errada. E os bois obedecem. É impossível não obedecer às ordens da dor.
O carro de boi é composto de três peças principais: rodas, eixo e mesa.
As rodas são de madeira maciça, resistentes. Medem, em geral, sete palmos de altura.
O Eixo é encaixado nas rodas com grampos de ferro "os gatos", ou engates.
A mesa é a parte de cima. Tem no centro um pau de madeira resistente (o cabeçalho) onde a junta de bois se engata.
O carro de boi tem sua música. A madeira do eixo, girando apertada na madeira do encaixe, produz um som contínuo, lamentoso, uivo de carpideira, um gemido sem fim. Tem um ditado popular que diz: "Carro de boi que não geme, não é bom."
O carro é composto por duas rodas, um grade ou mesa de madeira e um eixo. As rodas são feitas de madeira de boa qualidade, com um anel de ferro de forma circular nas extremidades, para garantir maior resistência.
Primitivamente o carro não era ferrado e as pessoas diziam que "o carro andava na madeira". A grade possui cerca de três metros de comprimento por um e meio de largura, com duas peças mais resistentes de cada lado e uma terceira no meio, mais comprida, destinada a atrelar o carro à canga, uma peça, também de madeira, com mais ou menos um metro de comprimento, contendo um corte anatômico para assentar bem no pescoço do boi, sendo segura por uma correia de couro chamada de brocha. A grade é apoiada sobre um eixo. O ponto de apoio da grade sobre o eixo são duas peças de madeira chamadas cocão. O chiado ou cantiga característica do carro de boi é produzido pelo atrito do cocão sobre o eixo. Entre o calço e o eixo é colocado um indispensável suplemento - a "cantadeira" - untada com uma pasta de sebo e pó de carvão, para fazer o carro gemer, quando atritada durante a marcha. "carro que não canta não presta. Não é carro!"... O seu gemido característico, ligeiramente modulado, constitui motivo de orgulho para o correiro que não dispensa nunca.
As madeiras utilizadas na construção dos carros de boi tinham que ser fortes, principalmente as das rodas. As mais usadas eram o pau d`arco, a aroeira, a sucupira e a carnaubeira.
O carro de boi pode ser puxado por uma, duas ou mais juntas ou parelhas. Cada junta possui dois bois, que trabalham um ao lado do outro, unidos pela canga.
Nos terrenos mais planos e em trabalhos mais leves utiliza-se, normalmente, uma parelha e nos mais pesados, desenvolvidos em terrenos mais acidentados, duas ou mais, uma atrás da outra. As parelhas são conjugadas por uma corrente que liga as cangas.
Nos engenhos, durante o verão, época da moagem, o boi era atrelado ao carro para transportar a cana e o açúcar e, no inverno, ao arado para revolver e cavar a terra destinada ao plantio da cana-de-açúcar.
Dois são os seus condutores: o carreiro e o candieiro. O primeiro caminha ao lado do carro, mantendo o ritmo vagaroso da andadura dos bois, ora gritando pelos seus nomes, ora picando-os com o "ferrão", normalmente uma vara fina, com mais ou menos três metros de comprimento contendo uma ponta de ferro para ferroar o animal, castigando-o ou indicando a direção a ser seguida. Usa também um chapéu de couro, um peitoral e um facão, colocado numa bainha de couro pendurado no cinto. O segundo, geralmente um menino ou um rapazelho, também munido de aguilhada, vai à frente da junta dianteira ou "da guia", dando a direção da marcha.
Os bois se acostumam de tal forma com o carreiro que, muitas vezes a um simples chamado dele, se dirigem vagarosamente e ficam parados próximo ao local onde são normalmente encangados. Batizados com nomes pitorescos, como Cara Preta, Presidente, Azulão, Lavareda, Malhado, Pachola, Curió, atendem pelo nome ao chamado do carreiro.
No início o linguajar do carreiro, elemento fundamental para a manobra dos carros de boi, não passava de sons gaguejados como "ôu!"... para parar os bois ou "êi!"... para fazê-los descer ladeiras. Evoluiu depois para frases e expressões tipo "Vamos embora!" e "Volta boi Azulão!" "Carrega boi Malhado!" O carreiro dirigia-se ao animal específico que queria comandar, sendo seus gritos reconhecidos e atendidos.
Além de ajudar no transporte de cana, açúcar e lenha nos engenhos, o carro de boi servia para transportar mudanças e conduzir pessoas. Havia também uma versão coberta. Foi utilizado como carruagem para a nobreza rural brasileira; como transporte de bandas de música das cidades para o interior e vice-versa; para levar as famílias sertanejas às festas de Natal e Ano Novo, quando eram todos enfeitados para a missão e, ainda, nas campanhas políticas, servindo de elemento de aproximação entre eleitores e candidatos
Nos anos de 1939 a 1945, durante a Segunda Guerra Mundial, devido a falta combustível para caminhões e automóveis, o carro de boi voltou a aparecer, por algum tempo em certas regiões do país ajudando a transportar cargas e pessoas.
Na história do Brasil, o carro de boi aparece na Colônia, no Império, na República, na Revolução de 1930 e no Estado Novo. Pode apresentar variações de "modelos" e nomes: carro, carroça ou carreta, como no Rio Grande do Sul, porém, nenhuma cidade, vila, povoação, fazenda, sítio, do litoral ao sertão ignora a existência deste rústico e primitivo meio de transporte, que ajudou a fazer a história do Brasil.
FONTES CONSULTADAS:
MELO, Manoel Rodrigues da. Patriarcas e carreiros: influência do coronel e do carro de boi na sociedade rural do Nordeste. 3.ed. Natal: Editora Universitária, 1985. p.161-218.
MOREIRA, Benedito. Das origens e da compreensão da romaria. Fragmentos de Cultura, Goiânia, v.11, n.2, p.293-310, mar./abr. 2001.
PEDROSO, Petronilo. Engenho banguê: termos relativos a instrumentos de trabalho, atividades e fatos da vida social. Nazaré da Mata, PE: Mousinho Artefatos de Papel, 1977. p.31-36.
SOUZA, Bernanrdino José de. O carro de bois em grandes fatos da história nacional. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v.184, p.93-118, jul./set. 1944.
Fonte: Blog do Nailson Moura
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