O episódio em que um vice-presidente da Caixa Econômica Federal pediu à presidente Dilma Rousseff, via Twitter, para ser demitido é um exemplo de duas coisas: 1) falta de capacidade gerencial e operacional nos altos escalões da República e 2) péssimo manejo político da coalizão governamental. Para não ser injusto, é relevante deixar registrado também que essa inépcia se reproduz em dezenas de governos estaduais e municipais.
O que aconteceu? Em setembro, o vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal (CEF), o político baiano Geddel Vieira Lima, entregou uma carta pedindo sua exoneração do cargo. O documento foi enviado ao vice-presidente da República, Michel Temer. Ambos, Geddel e Michel Temer são do PMDB.
Até esta semana, nada havia acontecido. A política se sobrepunha à gestão: tudo bem deixar a CEF com um vice-presidente demissionário, mas nada de desalojar uma peça importante do PMDB sem ter outra pronta para ser colocada no lugar.
Temer mostrou recentemente a carta à presidente Dilma Rousseff, que pediu que a situação fosse contornada até que um substituto fosse encontrado.
Qual tipo de substituto? Alguém que pudesse satisfazer aos desejos fisiológicos do PMDB por cargos e aos anseios políticos do PT de ter sob controle um partido como esse. É com cargos que o governo consegue apoios partidários e tempo de rádio de TV nas eleições de 2014.
Geddel Vieira Lima foi ministro da Integração Nacional durante a administração do petista Luiz Inácio da Silva. Antes, havia sido um dos mais fieis defensores do governo tucano de Fernando Henrique Cardoso. Também foi um feroz adversário na Bahia, seu Estado, de Antonio Carlos Magalhães (1927-2007). Hoje, é aliado fidelíssimo do herdeiro direto de ACM, o prefeito de Salvador ACM Neto (DEM).
Esse ecletismo em alianças e o apego a cargos públicos levou Itamar Franco (1930-2011), quando presidente da República, a descrever Geddel Vieira Lima como “percevejo de gabinete”. No início dos anos 90, como deputado federal, Geddel se notabilizou durante a CPI dos Anões do Orçamento ao prestar um dos depoimentos mais chorosos daquela investigação. Foi às lágrimas várias vezes. Apesar de seu nome ter constado em arquivos secretos da empreiteira Odebrecht (e de ele ter privilegiado 8 obras dessa empresa na condição de relator-adjunto do Orçamento da Secretaria de Desenvolvimento Regional), acabou absolvido.
Sem ter nenhuma qualificação profissional específica para o cargo de vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal (CEF), Geddel Vieira Lima foi nomeado para o cargo em 2011, durante o primeiro ano de Dilma Rousseff no Planalto.
Ontem (26.dez.2013), Geddel escreveu no perfil de seu microblog Twitter: “Cara Presidenta Dilma,por gentileza, determine publicação minha exoneração função q ocupo, e cujo pedido ja se encontra nas mãos de V Excia” (sic).
Nenhuma surpresa que um político como Geddel tenha feito o que fez –impor um constrangimento ao seu partido, o PMDB, e ao governo federal. É do jogo. Há até um benefício civilizatório nessa atitude, pois expõe à luz do Sol o que se passa muitas vezes apenas por trás das portas fechadas de gabinetes de Brasília.
Mas sobra muito de embaraço para o governo e para o PMDB.
Como é possível uma administração federal que controla a CEF (cerca de 80 mil funcionários e um lucro anual de bilhões de reais) nomear um político para um cargo de tamanha relevância como se fosse apenas uma sinecura para ganhar dividendos políticos?
[é importante dizer aqui que essa não é uma prática apenas petista, mas praxe generalizada em todas as instâncias de governo no país].
[é importante dizer aqui que essa não é uma prática apenas petista, mas praxe generalizada em todas as instâncias de governo no país].
Parece evidente que Geddel Vieira Lima nunca deveria ter sido nomeado para um cargo na CEF. Mas Dilma Rousseff o nomeou, apesar de todo discurso sobre meritocracia na administração pública. Hoje (27.dez.2013), saiu a exoneração do baiano no “Diário Oficial da União”.
Outra dúvida relevante: como é possível o vice-presidente da República, Michel Temer, que é também o principal cacique do PMDB, ter apadrinhado Geddel Vieira Lima e não ter conseguido controlar o processo de demissão do aliado?
Está em voga em Brasília uma narrativa: Michel Temer controla o PMDB e nada acontece no partido sem que ele queira ou saiba. O episódio do “twitaço” de Geddel faz desmoronar um pouco (ou muito) essa tese.
Geddel Vieira Lima comanda o PMDB na Bahia. Deseja ser candidato ao governo daquele Estado. Tudo bem. Mas sinaliza que fará campanha aberta contra Dilma Rousseff, que tentará se reeleger presidente em 2014… tendo Michel Temer, do PMDB, como candidato a vice-presidente. É algo próximo ao surreal.
O nome correto disso tudo é esculhambação política e bagunça gerencial. Não se sabe onde uma começa nem onde a outra termina. Não adianta culpar “o sistema”. Só entra no sistema quem quer. Dilma Rousseff e Michel Temer sabiam muito bem quem era Geddel Vieira Lima ao nomeá-lo para um cargo na CEF. Os responsáveis por esse episódio são eles, Dilma e Temer.
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